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VER(dadeir)ISSIMO

Por Ana Cristina Rosa (*) | 01/09/2025 13:30

O gaúcho Luis Fernando Verissimo (1936-2025) soube como ninguém tratar e retratar de forma sagaz e espirituosa várias das questões presentes no cotidiano do brasileiro. Com seus múltiplos talentos (cronista, romancista, humorista, cartunista, roteirista, dramaturgo, músico) não permitiu que a fama do pai – Érico (1905-1975), um dos maiores nomes da nossa literatura – ofuscasse seu próprio brilho.

Cresci lendo os Verissimo. Quando soube da morte do Luis Fernando, no sábado passado (30), me peguei rememorando alguns de seus escritos. Lembrei de uma crônica intitulada "Racismo" (1996), que compõe a obra "Comédias da Vida Pública". Por meio do diálogo entre patrão, um homem branco, e empregado, um homem negro, Luis Fernando deixou explicito como o racismo é real e está presente e arraigado na sociedade brasileira apesar da sua constante negação.

Seguindo à risca a maneira de falar, o texto demonstra como muitas "pessoas de bem" – gente que não se considera racista de jeito nenhum, até tem amigo negro – reproduzem o preconceito racial. E agem de maneira racista sim, mesmo que de forma inconsciente. Nas falas, os personagens reproduzem o pensamento equivocado (porém bastante comum, infelizmente) que associa e limita o negro ao desempenho do trabalho pesado, à beberagem, ao samba e à vadiagem. Com sua astúcia, Veríssimo explora várias expressões racistas que (lamentavelmente) fazem parte do nosso cotidiano para explicitar a naturalização do racismo à brasileira.

A conclusão do texto, é uma pérola que tomo a liberdade de reproduzir a seguir:

"- (...) E digo mais. É por isso que não existe racismo no Brasil. Porque aqui o negro conhece o lugar dele.

– É, mas…

-- E enquanto o negro conhecer o lugar dele, nunca vai haver racismo no Brasil. Está entendendo? Nunca. Aqui existe o diálogo.

– Sim, mas…

– E agora chega, você está ficando impertinente. Bate um samba aí que é isso que tu faz bem."

Luis Fernando Verissimo.

Verdadeiríssimo.

(*) Ana Cristina Rosa, jornalista especializada em comunicação pública e vice-presidente de gestão e parcerias da Associação Brasileira de Comunicação Pública (ABCPública)

 

Os artigos publicados com assinatura não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem como propósito estimular o debate e provocar a reflexão sobre os problemas brasileiros.