A ave das asas de remo: um sonho sereno
Foi ontem, mas parece que ainda está dentro de mim: sonhei um sonho sereno, de fim de tarde, de céu carregado de nuvens. Eu estava numa Avenida e sentia medo. Quando a chuva caiu, meu carro se transformou em uma canoa, daquelas dos povos originários, feita de um único tronco de árvore.
O asfalto aos poucos foi virando Rio e minhas mãos se transformaram em remos.
Um chapéu de palha plantou na minha cabeça de repente. Os pingos da chuva caiam na aba e formavam uma canção que nunca antes escutei. Chamei os pássaros cantarolando a canção, eles vieram, pousaram em meus ombros com suas penas molhadas, garras afiadas e os bicos pontiagudos.
Assoviaram junto comigo.
Quando a chuva aumentou foram me erguendo aos poucos, num voar prazeroso.
Eu era a ave das asas de remo.
A tarde caía e lá embaixo eu via as árvores, folhas molhadas, tomadas, tão verdes que quase cegavam. Bem ao centro, num único vão, o raio de luz, o caminho, águas cristalinas.
Então me desfiz do medo e o meu peito se abriu, mergulhei de cabeça e nadei rumo ao nada.
Sereno, sereno, sereno...
André Alvez