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Capital

Dependência química leva às ruas e à cadeia, num ciclo sem fim em Campo Grande

Relatório da Defensoria Pública mostra que 51% dos presos na Capital revela fazer uso de psicoativos

Por Anahi Zurutuza e Judson Marinho | 21/10/2025 10:05
Dependência química leva às ruas e à cadeia, num ciclo sem fim em Campo Grande
Usuários consomem pasta base de cocaína na Praça Aquidauana em plena luz do dia, em Campo Grande (Foto: Osmar Veiga)

Um ciclo que parece não ter fim: Em Campo Grande, a dependência química continua empurrando muita gente para as ruas e para a cadeia. O relatório 10 anos de Audiências de Custódia” divulgado pela Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul, por meio do Nucrim (Núcleo Criminal), nesta segunda-feira (20), mostra que mais da metade das pessoas presas na Capital declarou fazer uso de substâncias psicoativas, e 16% usam medicação controlada.

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A dependência química em Campo Grande tem levado pessoas às ruas e à prisão, segundo relatório da Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul. O documento revela que mais de 50% dos detidos na capital são usuários de substâncias psicoativas, enquanto 16% utilizam medicação controlada. Na região central da cidade, especialmente próximo à antiga rodoviária, usuários consomem pasta base de cocaína em plena luz do dia. Especialistas defendem que o problema deve ser tratado como questão de saúde pública, não de segurança, e alertam para a necessidade de políticas de Justiça Terapêutica e Redução de Danos.

Para defensores que trabalham com esses casos, “o estudo mostra que problemas de saúde mental e dependência química continuam sendo tratados com prisão, e não com cuidado”.

“O sistema de justiça está lidando com um público que demanda políticas de saúde, e não de punição. A criminalização da pobreza e do uso de substâncias apenas agrava a exclusão social. Precisamos avançar em políticas de Justiça Terapêutica e Redução de Danos, que humanizam o atendimento e reduzem a reincidência”, afirma a coordenadora do Nucrim, defensora pública Francianny Cristiane da Silva Santos.

A Polícia Militar, que mantém presença ostensiva no Centro “antigo”, bairro Amambaí e no Jóquei Club, região onde facilmente são encontrados os dependentes químicos perambulando, reconhece que a questão vai além da segurança pública. Em nota, informou que a presença de pessoas em situação de rua é “multifatorial” e depende da atuação conjunta de áreas como saúde, assistência social e urbanismo. Enquanto essa integração não acontece, os dependentes seguem tentando sobreviver, entre recaídas, estigmas e a esperança de um recomeço.

Dependência química leva às ruas e à cadeia, num ciclo sem fim em Campo Grande
Na região da antiga rodoviária, dependentes químicos perambulam, bebem e consomem drogas (Foto: Osmar Veiga)

O vício – Nas ruas, a equipe do Campo Grande News constatou que a pasta base, droga derivada do refinamento da cocaína, é hoje a mais consumida entre os usuários que circulam pelo Centro e bairros próximos.

Na antiga rodoviária, um homem de 41 anos conta que tem ferramentas de capinagem e pintura, faz reciclagem, mas não consegue se afastar do vício. “Isso é uma doença espiritual, mas não é por isso que a gente vai desistir de viver”, disse. Diz que tentou se tratar ao menos 13 vezes em clínicas de reabilitação, sem sucesso. “As pessoas acham que a gente rouba, mas, às vezes, somos dependentes de ajuda.”

Outro entrevistado, de 24 anos, começou a usar drogas há três meses, por influência de amigos. Disse que o vício avança rápido, começa com maconha ou bebida e termina em pasta base ou crack.

Além da pasta base, outras drogas, como o crack, também foram mencionadas. Um usuário, de 29 anos, que trabalha com recicláveis na antiga rodoviária, revela que já tentou abandonar a droga, também derivada da cocaína, mas admite não ter conseguido permanecer na reabilitação. Ele afirma sofrer de ansiedade e depressão. Por isso, busca fuga no entorpecente.

De acordo com o psicólogo João Carlos Sobreira, especialista no atendimento a pacientes com dependência química, cada caso precisa de tratamento individual. “Acredito que, na falta de uma boa avaliação psicológica. Alguns dependentes químicos que perdem os vínculos sociais e familiares acabam sendo internados sem necessidade. Em alguns casos graves, é sim necessário o isolamento social, mas depois precisa existir a opção de moradias assistidas para que esses indivíduos possam morar e voltar a ter autonomia e independência”.

É realmente difícil se livrar da dependência. O especialista estima que além de vários fatores inclusos no tratamento, a abstinência de psicoativos precisa ser total por pelo menos dois anos. Após esse período, os índices de recaídas diminuem consideravelmente. “A maioria não consegue se manter longe das drogas por esse tempo por não terem locais adequados”, pondera Sobreira.

Dependência química leva às ruas e à cadeia, num ciclo sem fim em Campo Grande
Coordenadora do Nucrim, defensora Francianny Cristiane da Silva Santos (Foto: DPMS/Divulgação)

O relatório – O relatório da Defensoria Pública analisou 4.941 audiências de custódia – trabalho feito por juízes para apurar a legalidade de prisões – realizadas na comarca de Campo Grande entre janeiro de 2024 e junho de 2025.

O estudo, elaborado para subsidiar o evento nacional que marca uma década de implementação das audiências de custódia no Brasil, revela dados sobre violência policial, seletividade racial e uso excessivo da prisão preventiva.

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