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Capital

Mais uma lei vem para o parto “sem dor”, mas faltam anestesista e punição

Fora da teoria, nascer no Sistema Único de Saúde esbarra nas precariedades da vida real

Aline dos Santos | 10/10/2021 09:28
Parto normal  favorece o contato pele a pele entre mãe e bebê logo após nascimento. (Foto: Thê Fotografia) 
Parto normal  favorece o contato pele a pele entre mãe e bebê logo após nascimento. (Foto: Thê Fotografia)

Com projeto aprovado ontem na Assembleia Legislativa, mais uma lei deve surgir em Mato Grosso do Sul para garantir à gestante parto normal com medidas de analgesia para diminuir a dor.

Contudo, pode ser uma nova “letra-morta”, a exemplo da Lei 5.217. Sancionada em 2018 para combate à Violência Obstétrica, a legislação não prevê punição para quem descumprir o dispositivo de “deixar de aplicar anestesia na parturiente quando esta assim o requerer”.

Fora da teoria, a prática mostra que nascer no SUS (Sistema Único de Saúde) esbarra nas precariedades da vida real: a falta de anestesistas para garantir a redução da dor. Para quem pode pagar na rede privada, o custo de um profissional particular para acompanhar o parto tem média de R$ 1.200.

Autor do projeto de Lei 154/2020, o deputado Marçal Filho (PSDB) relata que ficou sensibilizado com os relatos de sofrimento para mãe e bebê diante de práticas para forçar o parto normal. Desta forma, apresentou a proposta para que as gestantes pudessem escolher entre a cesárea a partir da 39ª semana de gravidez ou o parto normal. Mas, no trâmite legislativo, o projeto foi reformulado e a lei ganhou nova roupagem. Agora, será para garantir as medidas de analgesia no parto normal. A proposta foi aprovada ontem (dia 6) e segue para sanção do governador.

“Mudou porque a Secretaria Estadual de Saúde tinha anunciado que o governo iria vetar. Não aceitaria essa possibilidade de a gestante poder fazer a opção. Acabei tendo que aceitar a garantia da analgesia. Garantir que seja o mínimo de dor possível. Não deixa de ser um avanço”, diz o parlamentar.

O deputado destaca não compreender porque tanta resistência ao teor inicial do projeto. “Não sei se por trás disso tem a questão de parto normal não ter despesa. Mas sei que é real o sofrimento das mulheres. Vou continuar atrás disso, de a gestante ter opção de escolha”, afirma o deputado.

As medidas de analgesia começam com banho quente, relaxamento, movimentação, procedimentos realizados pela equipe de enfermagem. Caso a dor prossiga forte, entra em cena o anestesista, que utiliza quantidade de anestésico para amenizar as dores, mas que permitam que gestante tenha sensibilidade para prosseguir com o parto normal.

Porém, na prática, o profissional nem sempre está disponível. Lembrando que é preciso acompanhar todo o parto, que se se alonga por seis, sete horas. Já uma cesárea tem duração de uma hora e meia.

“O médico pode solicitar a analgesia. Mas nem sempre a gente consegue, porque o anestesista está em outro procedimento no hospital. Faltam médicos anestesistas em Campo Grande e a gente não consegue garantir a presença do profissional em tudo”, afirma o chefe do setor materno infantil do HU (Hospital Universitário), Ricardo Gomes.

O médico destaca que a Lei da Violência Obstétrica já determina as medidas de analgesia, mas acabou se tornando inócua porque não prevê punições. “Assim, a lei passa em branco, não tem penalização garantida. Se não oferecer analgesia para a paciente, não tem punição”, diz Gomes.

Para quem auxilia nos partos, a percepção é de uma realidade oposta ao que está no papel. “A maioria dos médicos desencorajam elas a fazer analgesia. No HU, eles têm problema realmente de não ter anestesista, de não ficar disponível no centro obstétrico. E, geralmente, querem fazer no centro cirúrgico, acaba atrapalhando as cesarianas necessárias. Falta muito conhecimento também sobre analgesia de parto normal”, afirma a doula Tatiana Marinho.

Outra profissional ouvida pela reportagem, mas que pediu para não ter o nome divulgado, conta que há até médico que negue analgesia por maldade.

“A analgesia durante o parto normal também é direito dela. Tem até lei que a protege as mulheres em relação a isso. O último parto que assisti, foi dada analgesia. Depende da conduta do médico, alguns médicos negam. Ou por maldade ou por medo de não conseguir acompanhar como deveria. Depois que é dada a analgesia, tem que ser acompanhado mais de perto o trabalho de parto porque o bebê pode sofrer alterações nos batimento. Às vezes, ele não tem estrutura. Outros médicos são maldosos mesmos e querem ir logo para a cesárea”.

Suficientes – Atualmente, o Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian tem 26 anestesistas, contratados por concurso pela Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares).

“Também estão sendo convocando 15 novos anestesistas do Concurso Nacional 01/2019 da Ebserh, que serão suficientes para atender as demandas do hospital. A necessidade de quantitativo total de anestesistas do hospital é de aproximadamente 40 profissionais”, informa nota do HU enviada ao Campo Grande News.

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