Mulheres quebram barreiras e conquistam espaço na construção civil em MS
De artesãs a porteiras, alunas sonham com estabilidade e novas oportunidades em canteiros dominados por homens
“Meu cérebro é de 25 anos. Eu quero sair para o mundo”. A frase de Marisa Quevedo, 60 anos, artesã e dona de casa, traduz o espírito das mulheres que decidiram se arriscar em um território ainda marcado pela presença masculina: os canteiros de obras. Em Campo Grande, elas estão sendo preparadas para pilotar máquinas, aplicar revestimentos e pintar paredes com técnica profissional.
RESUMO
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Em Campo Grande, mulheres estão quebrando barreiras na construção civil através do programa "Elas Constroem", iniciativa pioneira do Sinduscon-MS em parceria com a CBIC e o Senai. O projeto oferece cursos de operação de bobcat, assentamento de revestimento cerâmico e pintura imobiliária. Com 67 participantes selecionadas, o programa visa suprir a carência de mão de obra no setor, onde apenas 10% dos trabalhadores são mulheres em Mato Grosso do Sul. Após a conclusão dos cursos, um feirão de empregos aproximará as formandas do mercado de trabalho, com perspectivas de expansão para Dourados e Três Lagoas.
O desafio acontece dentro do programa “Elas Constroem”, primeira edição de um projeto nacional que começou em Mato Grosso do Sul antes de chegar a outros estados. A iniciativa é do Sinduscon-MS (Sindicato da Indústria da Construção), em parceria com a CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção) e com o Senai, e já começou com três turmas: operadora de bobcat, assentadora de revestimento cerâmico e pintura imobiliária.
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Entre as alunas, cada trajetória revela um recomeço. Marisa, que nunca imaginou trocar o artesanato pelo revestimento, agora sonha com estabilidade. “A gente não vive de artesanato. Estou em busca de novos conhecimentos para poder voltar ao trabalho. Você vai pegando certa idade e quer sair, não quer mais ficar trancada.”
Ela entrou no curso por influência de uma amiga, como um “caso do destino”. Além de uma nova chance no mercado, Marisa vê a capacitação como ferramenta para lidar melhor com reformas em casa. “Se um dia você colocar um pedreiro dentro da sua casa, você consegue comandar. E isso é excelente. Se tiver um emprego para mim, eu aceito de bom coração”, comenta com bom humor.
Já Anny Gabriele Oliveira, 38 anos, mãe de seis filhos e porteira há dois, viu na capacitação a oportunidade de melhorar o salário e dar mais qualidade de vida à família. “É um curso que achei que seria impossível estar no meu currículo. Hoje, graças a Deus, ele vai estar concluído. Estou feliz e acredito que depois que eu sair daqui, vou conseguir uma vaga no mercado de trabalho”, conta.
Neste sábado (16), Anny vibrou ao assumir pela primeira vez o comando da bobcat. “É totalmente diferente. É muito legal, adorei, já quero estar ali dentro operando. Se deixassem, eu ficava pilotando mais e já saía daqui para trabalhar.”
No curso de pintura, Michele Oliveira, 32 anos, viu a chance de retomar a carreira após deixar o setor logístico por questões de saúde. “Nunca tinha imaginado entrar na construção civil. Sempre tive como hobby, principalmente a pintura. Mas agora estou vendo que é uma oportunidade real de trabalho profissional.”
O crescimento da construção em Campo Grande foi o estímulo que faltava para Michele. “Estou bem animada. O setor aqui no Estado emprega muito, tem muitas oportunidades e a gente não fica limitado.”

Inspirando novas gerações — Na linha de frente do treinamento estão profissionais que já enfrentaram barreiras. A engenheira civil Iris Braga, com oito anos de experiência em obras, lembra das situações de machismo, mas hoje busca repassar às alunas a confiança que foi decisiva em sua carreira. “O lugar da mulher é onde ela quiser. Se acreditarem que são capazes, ninguém pode parar.”
Para ela, ver tantas mulheres entrando na construção é gratificante. “Ser mulher em qualquer área não é fácil, mas acredito que elas têm muito potencial para encarar todos os desafios de forma firme. Quero ensinar que, sim, elas têm que confiar em si mesmas e que são capazes.”
O engenheiro Renato Maia, responsável pelas aulas teóricas da bobcat, também vê mudança no setor. “Ainda existem muitos homens nas obras, mas as mulheres estão conquistando espaço. Não só na operação de máquinas, mas também no comando de obras, como engenheiras e técnicas de segurança.”

Mercado aberto — Segundo a superintendente do Sinduscon, Kely de Paula, a escolha dos cursos foi baseada em pesquisa com empresas. “Antes de começar o projeto, fizemos um levantamento com nossos associados para entender a demanda. Entre os cursos, bobcat e assentamento de revestimento cerâmico foram os mais procurados”, explica.
No total, 67 mulheres foram selecionadas. A previsão é abrir novas turmas já em setembro, com apoio de empresas parceiras como Plaenge, MRV e Vanguard. Ao fim da formação, será promovido um feirão de empregos para aproximar as participantes do mercado.
Temos mais de 50% da população formada por mulheres. Por que não qualificá-las para um setor que precisa tanto de mão de obra?”, questiona Kely.
Para o setor, o programa é uma forma de suprir a carência de mão de obra e, ao mesmo tempo, abrir espaço para diversidade. Hoje, cerca de 10% dos trabalhadores da construção em Mato Grosso do Sul são mulheres, algumas já em cargos de chefia, como na Plaenge.
Campo Grande é o ponto de partida, mas a meta é levar o projeto também para Dourados e Três Lagoas. Enquanto isso, as alunas seguem firmes, encarando cada aula como uma chance de mudar de vida e provar que o futuro da construção civil também pode ser delas.
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