Será que el patrón no tiene plata? A desconfiança reinava
Três paraguaios, trabalhadores de campo, exerciam suas atividades na fazenda denominada “Graça de Deus”, próxima ao rio Dourados. Em outubro de 1.932 foram convocados pelo exército de seu país para combater os bolivianos, na Guerra do Chaco. Pediram suas contas na fazenda e foram lutar. Um dia depois, chegaram os três paraguaios à “Estância São Tomás", próxima de Ponta Porã. Declararam que estavam sem recursos para seguir a viagem e desejavam trabalhar algum tempo por lá. O encarregado da fazenda, um tal Marino Oliveira, disse que, como também não tinha dinheiro (era muito raro naquele época), poderia contratá-los com os pagamentos sendo efetuados em mantimentos. A condição foi aceita.
Será que el patrón no tiene plata?
Oliveira abriu uma caderneta e, empunhando um lápis, perguntou os nomes dos paraguaios. Era assim que se firmavam contratos. Apenas com cadernetas. Eugênio Sanchez, respondeu o mais velho. Wenceslau Martinez e Felipe Pereira, os mais novos. “Muito bem”, disse Oliveira, “agora vou mostrar-lhes o galpão onde devem agasalhar-se, mandar entregar a ração de milho e indicar o piquete onde trabalharão”. Ao escurecer desse dia, os três conversavam com um outro já antigo na estância, quando, só referir-se ao modo de pagamento a que se sujeitaram, um deles disse: “Será que el patrón no tiene plata?” “Não sei. Penso que não tem”, respondeu o peão antigo. A conversa ficou por ai. Marino de Oliveira soube nessa mesma noite da pergunta e passou a noite em claro, preocupado com um imaginário ataque dos três viajantes.
A desconfiança reina na fronteira.
Marino passou a noite vendo em cada ruído o pisar cauteloso de alguém a lhe rondar o quarto. Pela manhã, encalhou o cavalo e dirigiu-se a Ponta Porã. Foi direto entender-se com a autoridade de emergência, o chefe de policia da cidade, a quem contou suas apreensões sobre os três viajantes paraguaios e voltou à estância.
Uma tropa para matar.
Uma hora da tarde, sol abrasador, dentro do galpão da estância vários trabalhadores faziam a “siesta” em suas redes. Ouviram o ronco de um caminhão que chegava. Desceram alguns homens vestidos de caqui, militarizados. Conversaram com Marino e com ele seguiram até o galpão. Todos se levantaram à vista dos uniformes e fuzis. Oliveira designou com os dedos os três viajantes. Eles foram agarrados e levados para junto do caminhão. Os uniformizados afastaram-se alguns metros e descarregaram seus fuzis. Logo embarcaram no caminhão e foram embora. Foi assim que, às treze horas do dia 27 de outubro de 1.932, foram sumariamente passados pelas armas os três paraguaios. Condenados pela desconfiança e medo de um chefete de fazenda. Era o “clima” reinante na fronteira.