Crise do cacau deixa Páscoa com mais açúcar e menos chocolate nas receitas
Produto aumentou 160,5% no ano passado e justificativa por problemas climáticos na África
A Páscoa deste ano pode ser “menos doce” para alguns consumidores. Isso porque o cacau, mais caro, pesou no bolso e acabou provocando até uma mudança no paladar. Com a valorização do produto, o reflexo foi imediato nas prateleiras: os ovos de Páscoa ficaram mais caros, menores e com menos cacau em sua composição.
RESUMO
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A Páscoa deste ano pode ser menos doce devido ao aumento no preço do cacau, que resultou em ovos de Páscoa mais caros, menores e com menos cacau. A produção de cacau caiu 18,5% no último ano devido a fatores climáticos e pragas, afetando também a qualidade do chocolate. Consumidores notaram a redução no tamanho dos ovos e a presença de mais açúcar para compensar a falta de cacau. A expectativa é de recuperação na produção internacional de cacau no segundo semestre e em 2026.
Segundo a AIPC (Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau), a queda no recebimento de cacau se deve a fatores climáticos adversos, como seca, e à incidência de pragas, que comprometeram severamente a produção nacional.
Além disso, a crise também é consequência dos extremos climáticos somados ao envelhecimento das áreas produtoras na África.
Dados compilados pelo SindiDados (Campos Consultores) e divulgados pela AIPC mostram que, durante o ano passado, foram recebidas 179.431 toneladas de amêndoas de cacau, queda de 18,5% em relação às 220.303 toneladas de 2023. No ano passado, o commodity saiu de US$ 4.238 a tonelada para US$ 11.040, alta de 160,5%.
O gerente da Casa dos Doces, na Rua Dom Aquino, Wilian Pereira, explica que, na prática, percebeu uma redução no percentual de cacau em alguns bombons, além do aumento no preço do chocolate.
“Como é um commodity, o pessoal altera os preços. No chocolate nobre dá uma diferença grande, mais de 30% do ano passado para agora, dos outros tipos, entorno de 10%. Na verdade, aumentou o ano passado, mas para nós já era o período da Páscoa. Temos um comprometimento com a indústria, a Páscoa é negociada em outubro, então, você negocia a compra, o seu consumo de chocolate do ano inteiro”, explicou.
Em relação ao gosto, ele afirma que está havendo diferença. “Pega um chocolate, consome bem devagar. Eles aumentaram o percentual de açúcar para reduzir custos. Tem menos chocolate”, completou. No local, as barras de 1 kg estão sendo vendidas entre R$ 24,49 e R$ 29,98.
No supermercado Pires, no Jóquei Clube, não tem sido diferente. O gerente Emerson Rodrigues afirmou que os preços estão altos, mas acredita que a procura pelos ovos de Páscoa será menor.
“O preço esse ano está maior e a procura está bem menor. Eu acho que esse ano vai ser uma procura maior por caixa de bombom e por barra, do que o próprio ovo em si. Reforçamos mais a questão de barra e caixa de bombom, estamos expondo mais, porque nós acreditamos que vai vender mais. Até a quantia que veio para nós, foi bem menor que no ano passado. Já é uma sinalização de que vai ter menos vendas”, disse.
Em pesquisa de preços realizada pelo Campo Grande News, em fevereiro, assim que os chocolates começaram a aparecer nas prateleiras, os valores variavam de R$ 16,99 a R$ 209,99. No ano passado, a reportagem encontrou variação de R$ 8,50 a R$ 149,99, também na região central.
Menor do que parece – Logo após abrir a embalagem, vem a decepção ao perceber que o ovo é bem menor do que aparentava. Na verdade, o que ocupa boa parte do espaço da embalagem são os copinhos no fundo e os brinquedos.
A técnica de enfermagem Gislaine Sena, de 41 anos, notou a diferença e comemora o fato de que a filha, de 15 anos, não se interessa mais pelos brindes que vêm com o ovo de chocolate.
“Está muito menor que antes. O bom é que hoje ela não liga mais para aqueles ovos de bichinho, com brinquedo dentro. As vezes, o brinquedo é maior que o chocolate. Eu opto por comprar caixa de bombom, acho que tem variedades, porque o ovo é ilusão. Minha filha tem 15 anos, já é jovem aprendiz. Então, vou falar para ela comprar o próprio ovo, ela vai sentir no bolso dela, não vai querer comprar, porque é muito caro”, disse.
Sobre o preço e o gosto, ela também percebeu mudança. “A qualidade também está muito mais baixa. Esses ovos caros, que eles colocam um preço absurdo, não está com a mesma qualidade. No ano passado, quando eu comprei um de prestígio, não estava com o mesmo gosto. Diminuiu a qualidade, mas o preço aumentou muito”, destacou.
A cabeleireira Idelaine Russo, de 38 anos, disse que vai comprar ovo só para o filho de 12 anos.

“Pretendo comprar de alguém que faz, porque no mercado é bem mais caro, o caseiro é mais barato. É bem perceptível que antigamente os chocolates eram mais gostosos. Hoje dá pra sentir o sabor da gordura, o chocolate não derrete na boca”, ressaltou.
Motivo – O economista, Eugênio Pavão, explica que essa mudança tem muito a ver com a oferta e demanda, além de questões ambientais.
“A oferta de cacau no mundo vem sofrendo bastante com as mudanças climáticas, com redução na oferta desde 2024, o que provocou alta forte de preços no produto para buscar o equilíbrio de mercado. A alta em 2024 foi de 189%, fazendo com que a indústria tivesse que reduzir a composição do produto nos bombons, chocolates. Além da questão ambiental, ocorreram problemas sanitários nas produções de cacau na Costa do Marfim, Gana e a Indonésia, maiores produtores do mundo. Junte a esse quadro de queda de oferta, inflação, alta do dólar e o aumento da demanda pelos chocolates, com forte investimentos em publicidade, franquias”, explicou.
Diante da situação, o profissional detalha o que pode estar acontecendo. “Para enfrentar esse momento, as indústrias brasileiras estão substituindo, no tradicional ovo de Páscoa e nos bombons, redução no conteúdo de cacau, visando enfrentar o desequilíbrio atual. As expectativas para esse ano é uma recuperação internacional da produção, cujos efeitos serão sentidos no segundo semestre e em 2026”, finalizou.
Pesquisa realizada pelo Sebrae/MS (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) e pelo IPF/MS (Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento da Fecomércio) aponta que as vendas de Páscoa devem movimentar R$ 396 milhões na economia de Mato Grosso do Sul. O valor representa crescimento de 7% em relação ao ano anterior.
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