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Educação e Tecnologia

Após casamentos e trabalho precoces, adultos buscam nova chance de estudar

A prova é destinada para pessoas que não terminaram o Ensino Fundamental ou o Ensino Médio

Por Izabela Cavalcanti e Raíssa Rojas | 03/08/2025 09:39
Após casamentos e trabalho precoces, adultos buscam nova chance de estudar
Participantes do Encceja entrando na Escola Estadual Dolor Ferreira de Andrade para fazer prova (Foto: Henrique Kawaminami)

O Encceja (Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos) 2025, realizado neste domingo (03), tem sido uma chance de reconstruir sonhos. Casamentos precoces, responsabilidade de cuidar dos filhos, dificuldade de transporte e a falta de tempo marcaram a trajetória de quem deixou a sala de aula cedo demais.

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O Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja) 2025, aplicado neste domingo (3), representa a oportunidade de retomada dos estudos para muitos brasileiros. Dificuldades como casamento precoce, responsabilidades familiares, problemas com transporte e falta de tempo são alguns dos motivos que levaram esses indivíduos a interromper sua trajetória escolar. A prova foi aplicada em Campo Grande, na Escola Estadual Dolor Ferreira de Andrade. Entre os participantes, histórias de superação se destacam. Andreia Porto, auxiliar de cozinha, viajou de Ribas do Rio Pardo para realizar o exame, buscando melhores oportunidades de emprego. Lucimara da Silva, vinda da Bahia, sonha em se tornar professora. Já Fernando Marcos Fernandes, agricultor, almeja aprimorar suas habilidades no campo por meio de um curso técnico. O Encceja, organizado pelo Inep, oferece certificação para aqueles que alcançam a nota mínima nas áreas de conhecimento e redação, permitindo a continuidade dos estudos e a busca por novas perspectivas.

Em Campo Grande, a prova está sendo aplicada na Escola Estadual Dolor Ferreira de Andrade, no Bairro Maria Aparecida Pedrossian. No período da manhã, as provas terminam às 12h. Já à tarde, a entrada será liberada a partir das 13h30 e encerrada às 14h15. As provas têm início às 14h30 e seguem até às 19h30.

A auxiliar de cozinha Andreia Porto, de 37 anos, saiu do trabalho às 2h10 em Ribas do Rio Pardo, deixou a bicicleta em casa e logo já pegou o ônibus até a Capital para fazer a prova.

Andreia começou a trabalhar cedo. Atuava em um viveiro durante o dia e tentou seguir com os estudos. Mas a realidade falou mais alto: um esposo doente, uma criança pequena e uma rotina sem brechas. Depois, casou-se e foi morar em uma fazenda.

Após casamentos e trabalho precoces, adultos buscam nova chance de estudar
Andreia escorada na parede aguardando dar a hora do Encceja (Foto: Henrique Kawaminami)

"Depois que eu casei, fui para a fazenda. Tive marido que não me deixou estudar, tinha ciúmes, então eu perdi o interesse. Graças a Deus não estou mais com ele, mas depois não tive mais motivação para continuar. Há quatro anos tento fazer, mas perdia a inscrição", explicou.

A primeira tentativa da prova foi em 2024. "Imaginei que seria mais difícil, pensei que seria ruim em Português e redação, mas o que me pegou foi matemática. Ano passado eu vi vídeos no YouTube, este ano, pela correria, não consegui, vim na raça", pontuou.

Ela conta que os cursos e empregos da fábrica de celulose da Suzano, em Ribas do Rio Pardo, exigem Ensino Médio — outra situação que a motivou a terminar os estudos.

"A gente vai ficando velha, meu serviço requer mais agilidade, sempre trabalhei pesado. Quero fazer um curso para arranjar um serviço em uma sombra. Eu tenho meus filhos, e eles todos estão estudando. Vão ver que a mãe também está e não vão parar", ressaltou.

Mãe de cinco, Andreia cuida da rotina de todos com firmeza. Os filhos têm 6 anos, 9 anos, 15 anos e 17 anos. O mais velho tem 22 anos, mora em Campo Grande e não completou os estudos.

“Ele não completou os estudos porque quis trabalhar, mas eu pego no pé. Eu trabalho à noite, durmo tarde, acordo cedo e levo todos eles para a escola, e não tem essa de faltar. Só falta se estiver chovendo e a sombrinha não tampa. Vai bravo, mas vai", disse.

Em meio às milhares de histórias que se cruzam neste domingo de prova do Encceja, uma delas veio de Mucuri, no Sul da Bahia. A dona de casa Lucimara da Silva, de 43 anos, está há 15 dias morando em Ribas do Rio Pardo.

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Lucimara dando entrevista ao Campo Grande News sobre o Encceja (Foto: Henrique Kawaminami)

"Parei de estudar com 12 anos porque eu casei, conheci um rapaz, começamos a namorar e casamos. Mas ele nunca me impediu de estudar. Para a minha família foi um choque, eles não esperavam isso”, contou.

Ela voltou a estudar de novo com 13 anos, mas logo parou. “Nunca concluía, era longe o lugar que morava. Eram 2 horas de relógio, e o veículo também era mais difícil", lembrou.

Apesar dos obstáculos, o sonho ficou guardado. Durante 3 anos, Lucimara trabalhou como faxineira em uma escola na Bahia, e foi lá que o desejo de ensinar floresceu.

"Eu quero fazer Pedagogia, quero ser professora. Trabalhei em uma escola lá na Bahia e gostei. Vou terminar os estudos para fazer Pedagogia. É meu sonho, então vamos lá", ressaltou.

O agricultor Fernando Marcos Fernandes, de 39 anos, acordou às 3h para tirar leite da vaca no local onde mora, em Terenos, e saiu de casa às 5h para chegar em Campo Grande.

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Fernando dando entrevista sobre o Encceja (Foto: Henrique Kawaminami)

Fernando está longe da sala de aula desde 2010. "Eu estudava à noite, trabalhava demais durante o dia. Acabei deixando os estudos de lado e foquei só no trabalho. Minha família incentivava, minha mãe é professora e meu pai trabalha em transporte escolar, então sempre ficaram no meu pé. Minha esposa também incentivou, eu tentei no ano passado e perdi o prazo de inscrição. Ela me incentiva muito”, disse.

O que motivou a continuar foi o sonho de fazer um curso técnico na área de agricultura. “Fico meio perdido, muito tempo fora da escola, até processar tudo. Estou bem confiante. Hoje, até no campo da agricultura, a gente tem que ter a tecnologia e a formação. A gente precisa disso. Quero fazer o curso para melhorar meu desempenho na agricultura — é a base”, concluiu.

Encceja – A prova é gratuita e destinada a jovens e adultos que não terminaram o Ensino Fundamental ou o Ensino Médio na idade adequada.

O exame foi criado em 2002 e é organizado pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais). Para participar, é necessário ter, no mínimo, 15 anos para o Ensino Fundamental ou 18 anos para o Ensino Médio.

As provas avaliam competências nas áreas de Linguagens, Matemática, Ciências Humanas e da Natureza, além de uma redação. Quem atinge a nota mínima em todas as áreas e na redação consegue o certificado.

Caso não atinja, o participante pode apresentar declaração parcial de proficiência e concluir as áreas pendentes em outra edição.

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