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Comportamento

Gilberto acolheu as navegações para salvar Corumbá do esquecimento

Histórias fascinantes das navegações pelo Rio Paraguai e relatos de viajantes foram transformadas em livro

Por Idaicy Solano | 12/11/2024 06:52
Gilberto Alves lançará livro sobre as navegações no Rio Paraguai. (Foto: Osmar Veiga)
Gilberto Alves lançará livro sobre as navegações no Rio Paraguai. (Foto: Osmar Veiga)

Décadas de história pesquisada e documentada pelo professor e historiador Gilberto Luiz Alves, de 78 anos, serão transformadas em um livro que conta a história do começo, auge e decadência das navegações pelo Rio Paraguai. A obra é ilustrada com uma riqueza de imagens, relatos de viajantes e análises do historiador.

O pesquisador se envolveu com o passado da cidade em um momento em que a memória era pouco valorizada, e muitos lugares, ricos em história e cultura, estavam abandonados. Ele descreve o livro como uma obra ricamente ilustrada e leve no estilo narrativo, mas, ao mesmo tempo, muito rigorosa do ponto de vista histórico.

“Cheguei lá na década de 80, quando aquilo era tratado como um lixo. Foi dentro do Centro Universitário de Corumbá que surgiu um movimento para a recuperação e o tombamento desses lugares. Então, me envolvi muito com a memória da cidade”, expressa Gilberto.

O historiador detalha que a introdução do livro retrata sua chegada a Corumbá, destacando o que sentiu ao chegar à cidade e o impacto diante de sua decadência. A partir daí, a narrativa segue com uma série de relatos de viajantes, a importância das navegações pelo Rio Paraguai e finaliza com um apanhado do que aconteceu na cidade ao longo do período.

“Falo sobre esses desencontros do ponto de vista do desenvolvimento. Pensa-se que, de repente, as coisas vão acontecer, mas nunca acontecem. A cidade é estagnada economicamente, com exceção da mineração e da pecuária. Como núcleo urbano, realmente parou no tempo. Então, discuto um pouco isso também nas conclusões”, detalha.

O livro é repleto de cartões-postais do final do século XIX e início do século XX, além de imagens de artes plásticas, todas do acervo pessoal do historiador. Ele comenta que, mais do que uma simples decoração em sua casa, vê o acervo como “registros do real”, que decidiu documentar em um livro.

“Os cartões-postais comecei a reunir, inicialmente, por curiosidade, e, em seguida, percebi como essas imagens são importantes para recuperar a memória regional”, completa.

Capa do livro "As águas Como Caminho" (Foto: Osmar Veiga)
Capa do livro "As águas Como Caminho" (Foto: Osmar Veiga)

Navegações pelo Rio Paraguai 

Gilberto explica que, até a Guerra do Paraguai, todo o comércio era feito com o norte do Estado de Mato Grosso, sendo Cuiabá, além de capital, o centro urbano mais expressivo da região.

O comércio era movimentado por tropas de cavalos, e as viagens duravam cerca de quatro meses entre Cuiabá e São Paulo, pelo trajeto de Goiás, subindo a serra da Chapada. Até que, poucos anos antes da guerra, os rios platinos foram abertos à navegação, mudando o ritmo do comércio.

“Antes, o Paraguai era um empecilho para a navegação livre pelos rios. Quando esse empecilho foi removido, a entrada para Mato Grosso passou a ser feita pelos rios, e os primeiros navios a vapor começaram a subir”, explica o historiador.

Gilberto detalha que, com as navegações, vieram também as mercadorias de luxo, como móveis, indumentárias, maquinários industriais e diversos outros itens que era impossível transportar a cavalo. A navegação predominou até a chegada da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, que alterou novamente o esquema do comércio na região.

“A partir daí, as mercadorias passam a chegar e também são exportadas pela Noroeste, a navegação entra em decadência e o trem substitui os navios. O auge da navegação foi em 1856, quando houve um acordo comercial entre o Brasil e o Paraguai para abrir a navegação, permitindo a chegada dos primeiros grandes comerciantes”, relata.

No livro há várias pinturas de Corumbá (Foto: Osmar Veiga)
No livro há várias pinturas de Corumbá (Foto: Osmar Veiga)

Gilberto detalha que as viagens iniciavam no Rio de Janeiro, com paradas no Estado do Paraná, nas cidades de Paranaguá, Antonina, São Francisco, Cananeia, depois em Florianópolis, até chegarem a Montevidéu, no Uruguai. As embarcações eram de pequeno ou médio calado e eram trocadas em Montevidéu, pois os transatlânticos não podiam subir o Rio da Prata.

A viagem continuava por Buenos Aires, até chegar a Porto Murtinho, Forte Coimbra, Corumbá, e só então subia até Cuiabá. O percurso durava cerca de um mês, e o roteiro está esquematizado logo no início do livro.

“A navegação pelos rios da Prata era muito difícil, porque os rios não são muito profundos. Então, os navios encalhavam com frequência, especialmente depois de Assunção. Era uma viagem desafiadora, mas era a única forma de acesso a Mato Grosso na época”, detalha.

Roteiro das navegações (Foto: Osmar Veiga)
Roteiro das navegações (Foto: Osmar Veiga)

Relatos dos viajantes 

A narrativa conta com relatos de quatro viajantes que passaram por Mato Grosso durante o período dominado pela navegação fluvial. O primeiro é um marinheiro italiano chamado Bartolomé Bossi, que se estabeleceu em Buenos Aires, onde abriu uma oficina de fotografia.

Ele visitou o Estado dois anos antes da Guerra do Paraguai e foi o primeiro a trazer a tecnologia da fotografia para Mato Grosso. Naquela época, a prática ainda era uma técnica bastante limitada, então Bossi entregou as imagens em um livro para um desenhista, na França, que reproduziu as fotografias em pinturas baseadas nelas.

O segundo viajante foi Severiano da Fonseca, irmão de Deodoro da Fonseca, que participou da Comissão de Limites entre Brasil e Bolívia e visitou o Estado após a guerra. O terceiro foi um naturalista americano chamado Herbert Smith, que passou por Mato Grosso em 1880. O último foi um militar estadunidense chamado Annibal Amorim, que visitou o Estado em 1910.

“Eles escreveram relatos detalhando as impressões, o que viram, o que sentiram. E aí tem coisas maravilhosas. Claro que também há bobagens, ditadas inclusive por preconceitos e outras questões, mas há informações riquíssimas e maravilhosas”, expressa Gilberto.

Cartões-postais do final do século XIX e início do século XX (Foto: Osmar Veiga)
Cartões-postais do final do século XIX e início do século XX (Foto: Osmar Veiga)

Lançamento 

O livro "As águas Como Caminho - Mato Grosso Como Destino" será lançado no dia 22 de novembro, às 19h, na Livraria Leitura, localizada no Shopping Campo Grande. A entrada é gratuita.

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