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Política

Entidades de MS pedem revogação de decreto federal sobre educação inclusiva

Instituições afirmam que norma “ameaça” funcionamento de Apaes e outras unidades especializadas

Por Mylena Fraiha e Fernanda Palheta | 03/11/2025 12:10
Entidades de MS pedem revogação de decreto federal sobre educação inclusiva
Presidentes e representantes de entidades de educação inclusiva de MS durante reunião com o deputado estadual Junior Mochi, na Alems (Foto: Fernanda Palheta).

A publicação do decreto federal que institui a Política e a Rede Nacional de Educação Especial Inclusiva mobilizou entidades que atuam com o AEE (Atendimento Educacional Especializado) em Mato Grosso do Sul. Na manhã desta segunda-feira (3), representantes de 25 instituições se reuniram na Alems (Assembleia Legislativa de MS) para debater o tema e pedir a revogação do decreto nº 12.686/2025, que obriga a inclusão de crianças com deficiência no ensino regular.

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Entidades que atuam com Atendimento Educacional Especializado em Mato Grosso do Sul se mobilizaram contra o decreto federal nº 12.686/2025, que institui a Política Nacional de Educação Especial Inclusiva. Em reunião na Assembleia Legislativa, 25 instituições pediram a revogação da norma. As organizações argumentam que o decreto ameaça o funcionamento de unidades especializadas como Apae e Pestalozzi. Criticam também a redução na exigência de formação dos profissionais de apoio escolar, que passa de nível superior para ensino médio com 80 horas de curso específico.

Convocada pelo deputado estadual Junior Mochi (MDB), a reunião contou com a presença de dirigentes da Apae de Campo Grande, Federação das Pestalozzis, AMA (Associação dos Amigos Autistas), Prodtea (Associação das Pessoas com Deficiência e Transtorno do Espectro Autista), além de representantes de entidades de Alcinópolis, Itaquiraí, Coronel Sapucaia, Paranhos e do Movimento Orgulho Autista Brasil.

As instituições afirmam que, embora o decreto defenda a inclusão, a forma de implementação "é uma ameaça" para o funcionamento das unidades especializadas, como Apae, Pestalozzi, Juliano Varela e Cotolengo Sul-Mato-Grossense.

Segundo dados apresentados, Campo Grande tem cerca de 5 mil crianças com deficiência matriculadas na rede regular, enquanto as escolas especializadas atendem milhares de estudantes. A Apae sozinha soma 6 mil alunos em todo o Estado.

Publicado em 21 de outubro, o decreto 12.686/2025 cria a Política Nacional de Educação Especial Inclusiva e reafirma o compromisso do país com a Constituição Federal, a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e a Lei Brasileira de Inclusão (13.146/2015).

A norma determina que a educação especial seja ofertada de forma transversal, em todos os níveis de ensino, e que o AEE seja complementar à matrícula em classes comuns, realizado em centros da rede pública ou instituições conveniadas.

O decreto também reduz a exigência de formação dos profissionais de apoio escolar: antes, o cargo pedia nível superior, mas agora permite atuação com ensino médio e 80 horas de curso específico.

A presidente da Feapaes-MS (Federação das Apaes de MS), Fabiana Maria das Graças Soares de Oliveira, disse que, ao ler o decreto, “levou um susto”. Segundo ela, as instituições especializadas estão sendo deixadas de fora da estrutura regulamentada.

“Nós sempre formamos uma rede de pessoas especializadas porque a pessoa com deficiência tem necessidade de múltiplos atendimentos, de equipe multiprofissional. Não é simplesmente colocando um professor na escola que você diz que ele vai dar conta”.

Ela também criticou a redução na exigência de qualificação dos profissionais que atendem estudantes com deficiência. “Nós lutamos muito pela formação especializada. A minha formação inicial nunca me deu competência para trabalhar com pessoas com deficiência. Não é banalizando a formação que teremos inclusão”, afirmou a presidente da Feapaes-MS.

Para Fabiana, um sistema educacional realmente inclusivo precisa conviver com diferentes modelos de escola.“O sistema inclusivo é aquele que permite a coexistência de escolas indígenas, do campo, especializadas e comuns. Não podemos eliminar modelos que atendem essa população”, destacou.

Também presente na reunião, a professora e pesquisadora Giselle Saddi Tannous, da Federação da Pestalozzi, apresentou resultados de sua dissertação de mestrado, realizada em 45 escolas estaduais. “Perguntei aos professores como era ter um aluno com deficiência na sala. Setenta e oito por cento consideraram desesperador, porque tinham mais de 40 alunos e nenhum recurso”, relatou.

Segundo Giselle, a realidade das escolas brasileiras não comporta a proposta de inclusão integral. “Estamos falando de escolas do Brasil, com analfabetismo estrutural, não da Suíça. E mesmo países desenvolvidos, como Suíça, Áustria e Alemanha, mantêm escolas especiais”, completou.

Já Michelle Dibo Nacer Hindo, da Prodtea, que tem familiares com autismo, classificou o texto como “decreto da morte”. “Os professores não vão aguentar e vão empurrar essas crianças para o ensino domiciliar. A consequência ficará para as mães”, afirmou.

Ela também destacou a desvalorização salarial dos profissionais de apoio já passam na Reme (Rede Municipal de Ensino). “As atendentes de nível médio em Campo Grande ganham cerca de R$ 2,5 mil, metade do piso nacional. Cuidam de até 12 crianças por dia, em dois turnos. Elas acabam desistindo porque não há valorização”, disse Michelle.

Michelle alertou que a falta de preparo desses profissionais pode transformar o papel pedagógico em mero cuidado básico. “Se o profissional não tiver formação educacional, será apenas uma babá. Meu filho foi alfabetizado porque teve uma professora especializada. Se só cuidassem da alimentação e higiene dele, nunca aprenderia a ler e escrever”, exemplificou.

O encontro resultou na elaboração de um documento conjunto, que será encaminhado à bancada federal de Mato Grosso do Sul. As entidades pedem votação urgente dos projetos de lei que buscam sustar os efeitos do decreto e cobram diálogo direto com o governo federal.

O grupo também propõe a realização de uma reunião ampliada para discutir a criação de uma política estadual de educação inclusiva, que garanta o funcionamento das instituições especializadas e a continuidade do atendimento às crianças com deficiência.

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