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Política

Pollon quer isentar imposto de armas a grupo suspeito de apoiar plano golpista

Denúncia envolvendo CACs faz parte da delação de Mauro Cid e integra ação em que o STF julga Bolsonaro

Por Vasconcelo Quadros | 01/05/2025 13:44
 Pollon quer isentar imposto de armas a grupo suspeito de apoiar plano golpista
Deputado Marcos Pollon, do PL de Mato Grosso do Sul. (Foto: Reprodução)

O deputado armamentista Marcos Pollon, do PL de Mato Grosso do Sul, entrou em mais uma polêmica. Ele protocolou na Câmara dos Deputados, na véspera do feriado de 1º de maio, o projeto de lei 1929/2025, propondo isenção de impostos federais (IPI, PIS, Cofins e Imposto de Importação) para a compra de armas de fogo, munições e acessórios destinados à prática do tiro esportivo por colecionadores, atiradores e caçadores — os chamados CACs.

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O deputado Marcos Pollon, do PL de Mato Grosso do Sul, propôs isenção de impostos federais para a compra de armas e munições por colecionadores, atiradores e caçadores (CACs). A medida surge em meio a denúncias de que esses grupos estariam envolvidos em um suposto plano golpista em 2022, conforme delação do tenente-coronel Mauro Cid. O STF investiga a participação dos CACs, acusados de apoiar Jair Bolsonaro em uma eventual ruptura democrática. Pollon, líder de uma entidade armamentista, enfrenta críticas até mesmo dentro da direita, acusado de beneficiar-se pessoalmente da causa. A proposta ignora o contexto político atual e as suspeitas sobre os CACs, reforçando a estratégia da extrema direita de manter o discurso armamentista nas redes sociais, mesmo sem respaldo institucional ou militar.

O problema não é apenas a desconexão com a realidade do país, hoje em direção contrária ao armamentismo: a proposta ignora que os CACs, neste momento, estão praticamente sentados no banco dos réus do Supremo Tribunal Federal (STF), ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro, por suspeitas de participação na tentativa de golpe de 2022. A acusação foi feita pelo ex-ajudante de ordens da Presidência, tenente-coronel Mauro Cid, em delação premiada.

Segundo Cid, o grupo civil ofereceria suporte armado ao então presidente, caso ele tivesse assinado o decreto golpista que anularia o resultado da eleição presidencial de 2022.

Com a abertura da ação penal que tornou Bolsonaro e outras 33 pessoas rés, a Primeira Turma do STF deve examinar nos próximos dias o conteúdo da delação. Logo no primeiro depoimento, prestado em agosto de 2023, Cid faz ao menos três menções à suposta participação dos CACs nas articulações para a ruptura democrática.

Na primeira, relata que um “grupo de radicais” que cercava e estimulava Bolsonaro acreditava que, “quando o presidente desse a ordem, ele teria o apoio do povo e dos CACs”, mesmo sem contar, como de fato não contou, com o apoio das Forças Armadas. Segundo Cid, esse grupo “romantizava” o artigo 142 da Constituição como base para o golpe — interpretação já rechaçada pelo STF.

Na sequência, Cid cita como integrantes dessa ala do PL os ex-ministros Onyx Lorenzoni (Casa Civil) e Gilson Machado (Turismo), os senadores Magno Malta (SE) e Jorge Seif (SC), o deputado Eduardo Bolsonaro (SP) e o general Mário Fernandes, autor do famigerado plano “Punhal Verde Amarelo” e atualmente preso. Todos, segundo ele, afirmavam reiteradamente que o ex-presidente tinha o apoio dos CACs para uma ruptura institucional.

No fim do depoimento, o militar afirma que influenciadores de direita nas redes sociais, como o blogueiro Oswaldo Eustáquio e os criadores do canal Hipócritas, Bismark Fugazza e Paulo Souza, também afirmaram a Bolsonaro que “os CACs o apoiariam em uma tomada de decisão”, atuando como “tropa civil” em caso de golpe. Cid destaca ainda que, entre os conspiradores, Eduardo Bolsonaro era o que mantinha mais contato com os CACs.

Atualmente licenciado e em autoexílio nos Estados Unidos, o filho do ex-presidente é próximo de Pollon, que se elegeu com apoio do clã Bolsonaro. O deputado lidera a principal entidade armamentista do país, a Associação Nacional Movimento Proarmas (Ampa), que chegou a ter cerca de 1 milhão de integrantes — três vezes mais que o efetivo atual do Exército e 13 vezes mais que a Polícia Militar paulista, a maior do país.

A constante citação dos CACs como uma milícia civil a serviço do golpismo serviu de argumento persuasivo num momento em que o bolsonarismo já sabia que não teria respaldo das Forças Armadas. Pollon, inclusive, vem enfrentando críticas dentro da própria direita e da bancada da bala, acusado por correligionários de se beneficiar pessoalmente da entidade, conforme reportagem publicada pelo jornal O Globo há três semanas.

Mauro Cid prestou depoimento sob compromisso de dizer a verdade, sob risco de anulação da delação e retorno à prisão. Agora, com a ação penal em curso, STF, Ministério Público Federal e as defesas dos réus confrontarão cada ponto da colaboração. Embora não mencione Pollon nominalmente, o envolvimento de CACs e líderes armamentistas na trama golpista será explorado em um capítulo à parte.

Os privilégios concedidos a CACs, como facilidades na obtenção de certificados de registro e porte junto ao Exército e à Polícia Federal, são amplamente conhecidos. Em 2022, último ano do governo Bolsonaro, foram emitidos cerca de 800 mil certificados.

Pollon tem desdenhado da denúncia que embasa a tentativa de golpe, embora esta tenha sido escancarada por depoimentos detalhados dos ex-comandantes do Exército, general Antônio Freire Gomes, e da FAB, brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior — ambos testemunhas centrais das tratativas.

Na justificativa de seu projeto, Pollon afirma que a proposta busca “reconhecer o caráter esportivo da atividade, além de aliviar a carga tributária que incide sobre praticantes regulares e legalmente cadastrados no sistema do Exército Brasileiro”. Defende isenção total de tributos federais sobre “produtos utilizados exclusivamente na prática do tiro desportivo”, e encerra com a frase que resume o discurso armamentista: “garantir maior incentivo à atividade e reforçar o direito individual à legítima defesa”.

Na prática, a proposta destoa da pauta institucional, mas segue a estratégia típica da extrema direita: falar para a bolha. Mesmo com argumentos frágeis ou desconectados da realidade, o objetivo é manter as redes sociais alimentadas. Procurado pela reportagem, o deputado não retornou.

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