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A “sigilosa” investigação do Gaeco

Por Ronaldo Franco (*) | 24/04/2014 15:14

O MP-MINISTÉRIO PÚBLICO é uma das instituições brasileirasque mais galgou degraus no prestígio e credibilidade popular nas últimas duas décadas. Um Brasil sem um MP autônomo e independente é absolutamente impensável. Nosso MPE/GAECO é um bom exemplo disto.

Posto este reconhecimento tenho que as imagens de policiais do GAECO portando armas de forma ostensiva dentro de órgãos públicos, “acompanhados da mídia local “ para proceder meras intimações de pessoas, em um processo reputado como sigiloso, exige uma reflexão da Procuradoria Geral de Justiça e daqueles que atuam no mundo jurídico, inclusive dos próprios Promotores do GAECO.

É estranho que a chamada investigação sigilosa do GAECO tenha esse nível de publicidade e ostensividade na execução de simples diligências.

Afinal a investigação está ou não em sigilo?

Toda a investigação está submetida ao TJ/MS?

Somente a diligência na casa do Prefeito foi submetida ao TJ/MS?

Não é o costume do MP submeter investigações ao crivo do judiciário quando preside investigações, como fazem os delegados de polícia civil, por obrigação legal.

Se toda a investigação 02/2014 estiver submetida ao TJ/MS, cabe a este chamar o procedimento à ordem.

Se o TJ/MS apenas atuou na busca e apreensão na casa do Prefeito, cabe ao próprio MP/GAECO refletir e reorientar seus atos no procedimento 02/2014.

O fato inconteste é que o GAECO adotou um jeito meio estranho de guardar sigilo ao procedimento 02/2014.

Um procedimento investigativo pode ser sigiloso quando visa proteger a privacidade da vítima ou dos investigados que ainda não possuem a culpa formada ou para que se possa surpreender infratores no curso de um ilícito penal ou ainda de posse de provas essências para confirmação de autoria e materialidade de crime.

No caso do procedimento 02/2014 o sigilo está se caracterizando um sigilo “meia boca”. Aparato ostensivo para atos de mera intimação com a mídia a tira colo contraria frontalmente o sigilo alardeado.

Este “sigilo meia boca” está dando azo a todo tipo de ilação acerca do objeto da investigação e de seus investigados.

É corrupção? É estelionato? Diz respeito à compra de parlamentares na cassação de Bernal? É pedofilia?

Estamos todos elocubrando as hipóteses. Isto expõe pessoas e as desgasta desnecessariamente. Atestado de idoneidade não superam o desgaste.

Este sigilo meia boca do GAECO no procedimento 02/2014 pode dar ao final a sensação de que “a montanha pariu o rato” ou que “a bomba vira uma espoleta”.

Classifico as imagens e ato de intimação dos vereadores como uma escorregada em pedregulho. Acerta no macro e erra no micro.

Não compartilho da JUSTIFICATIVA de que este tipo de ato ajude a firmar a imagem do MP no imaginário popular. Como já dito o papel do MP já é largamente reconhecido.

Também não compartilho da tese de que vereadores merecem tratamento distinto dos demais. Todavia tenho a convicção de que aquele ato de portar armas de forma ostensiva é descabido quando o ato for de mera intimação, seja dentro da Câmara Municipal, no prédio da Assembléia Legislativa ou no Jardim Los Angeles.

Parece que estas cenas decorrem de vícios de quem ainda acha que o prestígio popular o desonera de atuar com parcimônia e discrição, sem perder eficiência e eficácia de seus atos. Se for esta a raiz deste comportamento é preciso mudar.

Policiais Civis e Federais todos os dias executam centenas, senão milhares, de intimações de testemunhas e até investigados, portando armas de forma discreta, embaixo de suas camisas e camisetas, até porque a arma é algo inseparável para qualquer policial.

O fato das armas estarem discretamente cobertas pela camisa ou camiseta não retira um milímetro da autoridade destes policiais na execução de suas diligências.

Portar armas de forma ostensiva durante uma busca e apreensão é algo muito distinto de portá-la durante uma mera intimação.

O procedimento ostensivo e amplamente divulgado abriu brechas para se questionar a investigação em si, o que ruim para o GAECO e para a própria sociedade. Permitiu-se que o mérito da ação fosse ofuscado pela forma de sua exposição.

O próprio Desembargador que deferiu a diligência de busca na casa do Prefeito é um exemplo de parcimônia e discrição de suas decisões, logo não podem os executores desta diligência ser os primeiros a se distanciarem deste comportamento.

Nenhuma atividade pública, em especial às ligadas à promoção da justiça, está desonerada de ser feita com a parcimônia necessária para que o fim seja alcançado sem manchas e questionamentos, como é o caso. Não são poucas as investigações que desbaratam verdadeiros esquemas criminosos e ao final são anuladas por vícios em sua execução.

Nosso direito penal prestigiou a punição e os métodos, não é a toa que temos o CÓDIGO PENAL e o CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. Há fins e há meios legais.

Bem disse o apóstolo Paulo: “POSSO TODAS AS COISAS, MAS NEM TODAS ME SÃO CONVENIENTES”.

A finalidade é fazer JUSTIÇA e não EXECRAÇÃO E LINCHAMENTO PÚBLICO.

O Julgamento não é justo apenas pelo seu resultado, mas também pela sua forma e método. A boa intenção não salva por si só. Afinal somos um Estado Democrático porque somos um Estado de Direito.

E mais.

Estranho que alguns veículos de comunicação parecem obter informação antecipada e exclusiva para acompanhar determinadas diligências, não apenas do GAECO (diga-se de passagem).

Neste episódio quero crer que a presença dos veículos de comunicação foi mera coincidência. Não quero acreditar no contrário.

Se o GAECO acha necessário divulgar imagens de suas diligências deve fazê-lo nos termos do princípio basilar do MP: De forma REPUBLICANA, sem privilégios para este ou aquele veículo de comunicação. A Impessoalidade descrita no caput do artigo 37 da Carta da República deve ser zelada por aqueles que zelam pelo ESTADO DEMOCRÁTICO, no caso o MP.

O GAECO possui tecnologia própria para filmar suas ações, podendo depois divulgá-las de forma REPUBLICANA, se assim entenderem necessárias, dispensando assim qualquer presença de algum veículo de comunicação no curso de sua diligência.

É inconcebível qualquer agente público do MP ou a seu serviço conceder privilégios na divulgação antecipada de suas diligências.A divulgação de diligências para alguns meios de comunicação reforçam mais o Estado do Privilégio do que o Estado Republicano perseguido pelo MP.

Informação é dinheiro para os donos de veículos de comunicação e são essências na concorrência entre os meios de comunicação. Conceder privilégios é desequilibrar indevidamente a concorrência entre os diversos meios de comunicação.

Também não quero acreditar que a publicidade midiática no procedimento 02/2014 seja a forma de burlar o sigilo da investigação.

Quando fatos como estes acontecem toda sorte de questionamentos surgem de formas legítimas. Os investigados que estavam emparedados ganham argumentos.

A percepção de eficiência e eficácia da investigação em curso passa a ser contaminada por métodos não republicanos e inadequados na sua realização.

A Súmula da algema editada pelo Supremo Tribunal Federal e a orientação jurisprudencial de que mandados de busca e apreensão devem ser executados à luz do sol são sinais claros que a parcimônia e a discrição não é para proteger o infrator, mas o próprio Estado de ações com finalidades meramente midiáticas, que ao final se esgotam em si mesmo.

A pretensão punitiva estatal deve ser obra de todos, por isto fazer publicidade com meras diligências é um desserviço ao sistema punitivo estatal.

Precisamos adotar comportamentos de superação do jargão “A polícia e o MP prendem e o JUDICIÁRIO libera”. Punição e absolvição é obra de todos que atuam no sistema judicial.

Acho que a escorregada do GAECO neste pedregulho é uma boa oportunidade para reflexão e alteração de meios, formas e procedimentos, sem perder o firme e contínuo propósito Republicano que sustenta e norteia o MP local.

(*) Ronaldo Franco é advogado.

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