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ChatGPT ou pesquisa no Google? Informações para uma escolha consciente

Por Rafaela Samagaia (*) | 30/09/2025 13:30

Uma receita de bolo, uma figurinha, a resposta para uma pergunta qualquer, um endereço, uma análise a partir de uma perspectiva diferente ou simplesmente curiosidade. Usar o ChatGPT está na moda! Parece um pouco com a chegada de um bebê novo na família: todo mundo sabe com o que ele deve se parecer, mas cada um quer ir até lá dar a sua espiadinha! Mas você conhece as consequências desse “quase hábito” de solicitar à IA algo que você mesmo poderia fazer a partir de uma pesquisa em um motor de busca? E se o uso dessa ferramenta deixar de ser uma alternativa para se tornar uma necessidade, quanto isso vai custar em termos de destruição do ecossistema global? Que impacto teria na situação já catastrófica do planeta?

Mesmo para os especialistas, determinar com precisão o impacto de uma única demanda no ChatGPT ou qualquer outra IA disponível no mercado não é uma tarefa fácil. Principalmente porque a resposta depende da complexidade e do tipo de demanda. Assim, Sam Altman, CEO da OpenIA (responsável pelo ChatGPT), afirma que uma consulta ao prompt custa, em média, 0,34 Wh e 0,000084 galão de água (1/15 de uma colher de café). Parece pouco? Mas não é. O próprio ChatGPT, quando consultado sobre o assunto, chama a atenção para a necessidade de que se considere a grande quantidade de usuários no mundo, cada um deles fazendo dezenas de buscas todos os dias. Esses números também são contestados por ONGs de defesa do meio ambiente que obtêm valores muito mais altos em seus próprios estudos.

Para obter dados mais imparciais é possível consultar o site Drane, um organismo público francês que se consagra ao uso de ferramentas digitais na educação. Ele afirma que uma pesquisa de 400 tokens no ChatGPT/GPT-4o mini consome em torno de 2 Wh de eletricidade (o que equivale a 2g de CO2 liberado na atmosfera). Esse valor corresponderia a um pouco mais de seis vezes o consumo de uma busca idêntica no Google (estimada em 0,3 Wh). O mesmo organismo indica também que a criação de uma única imagem em alta definição por uma IA consome a mesma quantidade de energia que a recarga completa de um telefone celular. Ainda mais severo é o diretor do Instituto francês IA para a sustentabilidade da Escola de Comércio ESSCA, Dejan Glavas, que afirmou ao jornal Le Figaro que uma consulta no ChatGPT emite 60 vezes mais carbono do que uma pesquisa no Google.

No que diz respeito ao gasto com água, Luc Júlia, engenheiro que trabalha com o desenvolvimento de IAs (e que participou da criação da assistente da Apple, Siri) diz que bastam dez a 30 pesquisas no ChatGPT (dependendo da complexidade de cada uma) para que 1,5 litros de água potável se evapore na atmosfera. Além da perda de recurso hídrico que poderia servir para aplacar a sede de algum ser vivo, esse vapor d’água tem um impacto adicional, uma vez que sua presença na atmosfera contribui para o aquecimento global.

É importante atentar que esses números não consideram o custo da aprendizagem da IA nem a manutenção dos data-centers, vorazes em água e eletricidade. Eles também não contabilizam o custo ambiental dos equipamentos utilizados nos dois casos (IA e motores de busca) nem a pegada de carbono da sua produção e distribuição.

Se você está assustado com esses dados, mas é uma pessoa que já aderiu à IA e não está disposta a renunciar, o Drane oferece alguns conselhos para minimizar o impacto:

1. Concentre seu uso em situações em que a inteligência artificial possa realmente oferecer algo a mais do que a simples pesquisa no motor de busca.
2. Ao utilizar o prompt, formule demandas precisas, tão curtas e exatas quanto possível. Cada uma das idas e vindas em busca de ajuste ou precisão representa uma nova pesquisa, multiplicando a sua pegada de carbono.
3. Evite conversas prolongadas com o chatbot.

E esse também parece ser um ponto de atenção: se você conversa mais com ele do que com o seu liquidificador, talvez seja o momento de procurar ajuda.

Outro ponto que precisa ser considerado na decisão entre o motor de buscas e a IA é a qualidade do resultado final. Um estudo desenvolvido em 2023 por pesquisadores de Hong Kong atribui um índice de pertinência de 64% para o ChatGPT-3.5 e de 78% para o ChatGPT-4. (o que os coloca na categoria “aluno mediano”). Para Luc Júlia, essa confiabilidade deve baixar ano após ano. Ele explica a previsão da seguinte maneira: as IAs generativas não criam conteúdo, mas mastigam o que já está disponível na web. Como uma parte cada vez maior desse recurso é produzida pelas próprias IAs, o porcentual de erro tende a acumular-se. Eric Moulines, professor do Centro de Matemática Aplicada da École Polytechnique de Paris, explica ainda que o ChatGPT erra porque não é capaz de avaliar a veracidade nem a complexidade analítica dos dados que utiliza. Diferente do que faria uma verdadeira inteligência (a sua, por exemplo!), a tecnologia não compreende o que anuncia, ela apenas calcula probabilidades e, em função delas, seleciona sequências de palavras. Isso torna os conteúdos propostos epistemologicamente diferentes daqueles que um ser humano produz, seja ele proveniente da sua experiência do mundo ou meramente teórico.

Ou seja, se a pesquisa que pretende fazer é sobre um tema que conhece, se você se sente capaz de localizar os erros que estarão presentes na resposta da IA, você está seguro. Pode utilizá-la. No entanto, levando em conta o impacto ambiental dessa tecnologia e a energia que deverá investir para corrigir o resultado, talvez valha mais a pena compilar você mesmo as respostas obtidas em uma busca no Google. Além de garantir a qualidade do resultado, poderá apropriar-se de novas informações, melhorando o seu próprio conhecimento sobre o assunto.

Já se a demanda envolve um tema que você desconhece, cuidado! Enquanto a pesquisa no motor de busca permite selecionar a fonte, o texto de uma IA não deixa pistas sobre a fiabilidade de cada elemento utilizado. A única coisa que você pode ter certeza é de que algo em torno de 30% do resultado não é pertinente ou simplesmente não corresponde ao mundo real (são as chamadas alucinações, com frequência produzidas pelas IAs por conta da ausência de conexão com o mundo em que vivemos.) Se esses erros podem escapar aos seus olhos, certamente serão percebidos por alguém que conhece o assunto melhor do que você.

(*) Rafaela Samagaia, pesquisadora do Instituto de Estudos Avançados da USP.

 

Os artigos publicados com assinatura não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem como propósito estimular o debate e provocar a reflexão sobre os problemas brasileiros.