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O aprendizado da agricultura no combate ao Aedes aegypti

Por Maurício Antônio Lopes (*) | 19/03/2016 08:51

O clima tropical permitiu ao Brasil intensificar sua agricultura em níveis inéditos: graças ao avanço tecnológico alcançado é possível chegar a três safras ao ano em muitas partes do território brasileiro. No entanto, a abundância de sol, calor e umidade, que favorece o desenvolvimento das lavouras, também acolhe e multiplica grande diversidade de doenças e pragas.

Para lidar com a multiplicação dessas pestes da agricultura, a pesquisa agropecuária formulou, há décadas, o MIP (Manejo Integrado de Pragas). O MIP preconiza períodos sem cultivo – chamados de "vazios sanitários" –, épocas diferenciadas de plantio, rotação de culturas, uso de materiais genéticos tolerantes ou resistentes, controle biológico de insetos-praga com o uso de vírus, bactérias, predadores e parasitas, além do controle químico. A combinação dessas soluções amplia substancialmente a capacidade dos agricultores de controlar as pragas das suas lavouras.

Experiências de sucesso no controle de inúmeros insetos-praga da agricultura podem complementar o conhecimento já desenvolvido pelos órgãos de saúde pública e auxiliar na busca de alternativas para o controle de insetos vetores de doenças. A prática de manejo integrado é uma delas e pode auxiliar na contenção da preocupante expansão populacional do mosquito Aedes aegypti, e de suas consequências graves para a população brasileira, como a transmissão de vírus causadores da dengue, chikungunya e zika.

O Aedes aegypti é um mosquito doméstico. As fêmeas se alimentam de sangue humano, e por isso vivem dentro ou ao redor de domicílios e outras construções frequentadas por pessoas. É fundamental concentrar a ação para seu monitoramento e controle em áreas com alta densidade populacional. Sobretudo onde ocorre ocupação desordenada, porque aí as fêmeas do mosquito dispõem de mais alimentos e mais locais para desovar.

Os mecanismos de adaptação e de dispersão do inseto são muito eficientes, à semelhança de diversas pragas agrícolas. Isso exige a combinação de diversos métodos e técnicas para inibir o crescimento da sua população. Cada fêmea vive de 30 a 35 dias. Nesse período, faz de quatro a seis posturas, podendo dar origem a até 1.500 mosquitos. Os ovos são distribuídos por inúmeros criadouros. Isso garante a dispersão da espécie e sua preservação, porque dificulta o seu combate. Além disso, os ovos resistem em ambientes secos por até 450 dias, permitindo que aguardem o retorno da umidade e do calor para que eclodam.

Estamos, portanto, tratando com situação inusitada, protagonizada por um organismo extremamente sofisticado e versátil. O controle químico, por meio da nebulização de inseticidas líquidos (fumacê), que matam apenas os insetos adultos em voo, tem eficiência limitada. Seu uso continuado provoca o surgimento de insetos resistentes aos principais inseticidas utilizados, além do que, não atinge o interior das residências, onde número significativo de mosquitos fica protegido.

Por tudo isso, a redução efetiva da população de Aedes aegypti requer práticas de manejo integrado, que combinem diferentes ações de controle. Além de intensificar ações de limpeza e eliminação dos locais de reprodução do mosquito, e de aplicação planejada de inseticidas químicos, de baixo impacto ambiental, onde há concentração muito alta de adultos, é necessário preparar a população para atuar diretamente na eliminação das fontes de risco no interior e ao redor das residências.

Aí, o combate às larvas dos mosquitos pode ser realizado com sucesso por meio da aplicação de biolarvicidas à base da bactéria Bacillus thuringiensis israelensis (Bti). A Embrapa e empresas parceiras já desenvolveram dois desses bioinseticidas, que são eficazes no controle das larvas, sem causar danos a humanos e animais. Assim, podem ser usados diretamente pelas pessoas, sem riscos.

Outras tecnologias, baseadas em macho-esterilidade e transgenia - que interferem na capacidade reprodutiva do inseto - e no uso da bactéria do gênero Wolbachia - que impede que o mosquito transmita o vírus da dengue ao picar alguém -, já estão em teste no país e poderão ter sua aplicação intensificada no futuro.

Do mesmo modo, estão sendo entregues para a sociedade ferramentas para monitoramento e gestão da crise e das ações de controle, na escala territorial. A Embrapa está testando, em Campinas, um sistema que integra imagens de satélites, mapas de precisão, levantamentos de campo e fotos aéreas para monitorar a luta contra o mosquito, mostrando a distribuição espacial dos casos de dengue e dos focos de mosquito, num mapa municipal com até 2 metros de detalhe.

Assim, usando o melhor conhecimento disponível, que já temos na agricultura e na saúde pública, integrando diferentes ferramentas e estratégias de controle, e mobilizando a cidadania, devidamente orientada e instrumentalizada, teremos mais sucesso no controle dessa terrível praga.

(*) Maurício Antônio Lopes é presidente da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária)

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