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O santo da internet: o adolescente gamer que foi canonizado

Por Ronaldo Lemos (*) | 07/09/2025 13:30

Carlo Acutis nasceu em 1991 e como muitos garotos da sua geração adorava jogar videogames e a internet. Ele é o mais novo santo católico. Sua canonização aconteceu neste dia 7 de setembro de 2025. Foi feita após dois milagres realizados em seu nome terem sido aceitos pela igreja. Um deles no Brasil.

Em 2013 ele teria curado o brasileiro Matheus Vianna de uma doença congênita no pâncreas. Ao tocar uma relíquia e pedir sua intercessão, os vômitos que sofria cessaram e exames posteriores confirmaram sua recuperação. Matheus tem hoje 16 anos e mora em Campo Grande.

Em vida, Acutis foi além dos games. Aprendeu a programar e aos 11 anos começou a criar sites, um deles dedicado a registrar milagres eucarísticos pelo mundo. É curioso visitar uma página da web feita por um santo. Acutis faleceu aos 15 anos, vítima de leucemia. Ele está sepultado em Assis na Itália em tumba aberta.

No sepulcro, veste moletom, calça jeans e tênis. Sua relação com a tecnologia não terminou com a morte. No YouTube há uma transmissão ao vivo permanente da tumba. Assisti por bastante tempo e a fila é constante, com muitas crianças e jovens.

Fé e tecnologia estão se relacionando de maneiras novas. A começar pelo avanço da inteligência artificial. Por causa dela, profissões como filósofos e teólogos estão em alta. O próprio Vaticano tem seu teólogo especializado em IA, o incrível Paolo Benanti. Faz sentido, já que a inteligência artificial nos obriga a revisitar questões que a teologia vem trabalhando há pelo menos 2300 anos.

Ao mesmo tempo, um estudo de Harvard de 2023 apontou que na Geração Z cresceu em 6% aqueles que se autodeclaram católicos nos EUA (de 15% para 21%). Mais recentemente, o Registro Nacional Católico dos EUA detectou aumento de 30% a até 100% no número de fiéis em várias dioceses.

No Brasil há fenômenos curiosos também, como missas sendo realizadas dentro do Roblox. Cheguei a sugerir ao arquiteto Isay Weinfeld que ele projetasse uma igreja "virtual" dentro da plataforma.

Como católico, acho tudo isso fascinante. Pode ser um sinal de que muita gente está percebendo que um dos maiores riscos da inteligência artificial é ela servir como uma falsa "transcendência". Essa ilusão é reforçada por ideologias como a "singularidade", o "Homo Deus" e a postulação de que o tecnológico irá suplantar a natureza. Na minha visão, tudo isso são caminhos para nos isolar do cosmos. De substituir a existência infinita e ilimitada (e o que vem antes e depois dela) pela estreiteza daquilo que é derivado apenas do humano, como a IA.

Como escreveu São Sofrônio de Essex: "A função dos dogmas religiosos é precisamente limitar a supremacia do intelecto no pensamento teológico". A IA é uma tecnologia de pura imanência que pode virar prisão. A fé ajuda a fugir dela.

Ou como disse o escritor Georges Bernanos: "O perigo não está na multiplicação das máquinas, mas no número crescente de pessoas acostumadas desde a infância a desejar apenas aquilo que as máquinas podem oferecer". São Carlo Acutis, afasta de nós esse cálice!

(*) Ronaldo Lemos, advogado e diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro

 

Os artigos publicados com assinatura não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem como propósito estimular o debate e provocar a reflexão sobre os problemas brasileiros.