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Comportamento

Após 15 anos entre “esquina e biqueira”, Monique comemora diploma para trabalhar

Mulher trans, ela conta que se via atormentada pela ideia de não ser amada por Deus

Por Aline dos Santos | 06/09/2025 11:23
Após 15 anos entre “esquina e biqueira”, Monique comemora diploma para trabalhar
Monique Rocha abraça o pastor Milton, na Igreja Tabernáculo da Glória. (Foto: Osmar Veiga)

Sozinha no mato, num terreno baldio de Dourados, Monique Rocha, 37 anos, trazia consigo quem dominava todos seus atos há 15 anos: a pasta base, popular zuca. Mas, naquele instante, se via dividida. De um lado, a rua que tão bem conhecia pela dependência química e a prostituição. Do outro, a lembrança do tempo que passou “limpa” no projeto social de igreja em Campo Grande.

RESUMO

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Monique Rocha, mulher trans de 37 anos, superou 15 anos de dependência química e prostituição para conquistar seu diploma de técnica em enfermagem. Após passar por um período crítico nas ruas de Dourados (MS), encontrou acolhimento na Clínica da Alma, projeto social da Igreja Ministério Pentecostal Tabernáculo da Glória. Durante sua jornada de recuperação, Monique descobriu uma nova paixão pela área da saúde, especialmente pelo centro cirúrgico. Atualmente, está concluindo o curso de instrumentação cirúrgica e planeja continuar seus estudos. O projeto social, que já atendeu 10 mil pessoas em situação de rua, oferece alimentação, moradia e oportunidades de profissionalização.

A decisão não foi fácil  nem imediata. Porém, a rua ficou no passado, o presente é a conclusão do curso de técnico de enfermagem e o futuro é o desejo de trabalhar no centro cirúrgico.

“Nessa conversa, eu pedi para Deus. Me dê desejo para parar de usar drogas. Me dê força de vontade. Porque, se eu tiver isso, sei que vai funcionar. Ainda demorou um tempinho para eu poder ser resgatada pela minha família. Quando me encontraram, ainda tive muita resistência porque estava com droga. Eu fiz um acordo com a minha amiga. Falei: eu vou para a sua casa, mas não vou jogar fora, vou usar lá”, conta Monique.

Mulher trans, ela conta que se via atormentada pela ideia de não ser amada por Deus.

Após 15 anos entre “esquina e biqueira”, Monique comemora diploma para trabalhar
Monique viveu 15 anos pelas ruas de Dourados. (Foto: Osmar Veiga)

 Desde pequena, pela minha identidade de gênero, sempre fui muito desmotivada a acreditar em Deus. As pessoas usam muito a Bíblia para condenar. Eu cresci com essa ideia de que não era merecedora do amor de Deus. Que Deus não me amava. Isso enraizou”.

Outra dificuldade era encontrar um local para ficar, pois só era aceita nas unidades masculinas.

“Eu não conseguia nenhuma casa de acolhida. Não me aceitavam. E uma trans numa comunidade masculina, ela não viveria essa recuperação”.

No dia 29 de junho de 2020, Monique chegou a Campo Grande para ser acolhida na chácara feminina da Clínica da Alma, projeto social da Igreja Ministério Pentecostal Tabernáculo da Glória, ligado à Fraternidade na Rua.

Depois de dormir nas praças, tomar banho em valeta e viver uma rotina entre a “esquina e a biqueira”, ela encontrou oportunidade de fazer cursos e estudar.

Após 15 anos entre “esquina e biqueira”, Monique comemora diploma para trabalhar
Monique fez curso de técnico em enfermagem. (Foto: Arquivo pessoal)

Porém, quando tudo parecia melhorar, ela desistiu e voltou a perambular pelas ruas de Dourados. “Eu fique cinco meses aqui e voltei. Digo que eu precisava beber um pouco mais da água da miséria. Porque nesses dois meses na rua eu sofri mais do que em 15 anos. Aqui, graças ao pastor, eu conheci um pouco da palavra de Deus e entendi que a Monique é amada por Ele tanto quanto você, o pastor ou qualquer outra pessoa”.

De volta ao projeto social, ela decidiu fazer o curso de técnico de enfermagem. “Eu precisava de uma profissão para sair daqui segura. E não imaginava que ia gostar tanto”. Ela pensava em trabalhar com idosos, mas, no meio da jornada, se apaixonou pelo centro cirúrgico. O momento definitivo foi quando viu uma cirurgia no coração, de peito aberto.

“Eu me encontrei. Foi um curso que eu criei um amor muito grande. O dia em que você vê um coração batendo, não tem como não se emocionar”. Monique começou o curso de instrumentação cirúrgica. “Tudo isso graças ao projeto, que arca com tudo”. Monique se dedica aos estudos e viaja uma vez por ano para ver a família em Dourados.

Após 15 anos entre “esquina e biqueira”, Monique comemora diploma para trabalhar

 Daqui a um mês eu termino o curso de instrumentação. Mas acredito que não vai parar por aí. Estou feliz. Acredito que Deus usou a Monique para fazer o próximo olhar para nós. O desejo vem, mas não existe mais para mim essa possibilidade de usar. Eu estava cansada, era uma vida triste. Sem a droga, eu voltei a ver beleza na vida. É bonito ver uma rosa desabrochar”.

Em parceria com a Clínica da Alma, o projeto Fraternidade Rua atende 350 pessoas. Os atendimentos são separados entre homens e mulheres. A decisão de ir à Clínica da Alma é voluntária. São oferecidos cinco refeições diárias, alojamento, roupas, cursos, assistência médica, odontológica, oficinas de trabalho, amparo espiritual, emocional e físico. Em 18 anos de existência, o projeto acolheu 10 mil pessoas em situação de rua.

A igreja é liderada por Milton César Montanheri Marques, o Miltão, que foi morador de rua e dependente químico.

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