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Capital

Projeto de IPTU vira alvo sob argumento de insegurança jurídica que ameaça obras

Construtores, corretores e OAB/MS são contra texto que prevê imposto inicial de 1% subindo a 3,5%

Por Aline dos Santos | 11/09/2025 14:58
Projeto de IPTU vira alvo sob argumento de insegurança jurídica que ameaça obras
Portaria de loteamento de luxo no Jardim Veraneio, em Campo Grande. (Foto: Henrique Kawaminami)

Projeto de lei com mudanças no IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) é questionado pela OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil) por insegurança jurídica, enquanto o  setor empresarial aponta que a proposta pode levar a uma fuga de investimentos, prejudicando as finanças de Campo Grande.

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Polêmica sobre IPTU em Campo Grande gera insegurança jurídica e preocupa setor imobiliário. Mudanças propostas pela prefeitura no cálculo do imposto, como a cobrança em lotes de condomínios ainda em construção e aumentos considerados abusivos, têm gerado críticas de empresários e da OAB-MS. Aponta-se o risco de fuga de investimentos e prejuízo para a economia local. Setor da construção civil questiona a alíquota progressiva do IPTU em loteamentos, alegando insegurança jurídica e impacto negativo no mercado imobiliário. Discussões sobre a atualização da Planta Genérica de Valores e a possibilidade de aumento do imposto por decreto, sem consulta à Câmara Municipal, também geram controvérsia. Enquanto a prefeitura defende a proposta como incentivo à construção, críticos apontam para possíveis distorções e aumento da judicialização.

“Basicamente, o grande problema é a tributação equivocada de IPTU. Está havendo distorções de 1.700% nos valores do imposto em bairros vizinhos. Também há a cobrança durante as obras de condomínio fechado e loteamento. Isso gera insegurança jurídica e tributária muito grande. Nenhuma construtora ou loteadora vai continuar investindo em Campo Grande num cenário desse”, afirma o empreendedor imobiliário Rubens Filinto.

De acordo com ele, a gleba onde ainda não foi feito o loteamento paga alíquota de 0,5% de IPTU. O desembolso é da construtora. Mas, durante a obra, a prefeitura já vai individualizar a matrícula e começar a cobrar como se o condomínio estivesse pronto. “A alíquota sobe para 3,5%. O valor vai lá para cima e o imposto é lançado no nome do comprador do terreno”.

Projeto de IPTU vira alvo sob argumento de insegurança jurídica que ameaça obras
"Basicamente, o grande problema é a tributação equivocada de IPTU", diz Rubens. (Foto: Reprodução)

Segundo Rubens, em caso de loteamento de luxo, o valor pode chegar a R$ 90 mil por ano. “Mas isso também está acontecendo com a população mais pobre”. Ele exemplifica que um terreno popular tem cobrança de R$ 3 mil de IPTU, equivalente a dois salários mínimos. “Isso se assemelha a um confisco. Um loteamento social, voltado a pessoas de baixa renda, deveria ser isento de IPTU para incentivar a compra da casa própria e evitar a favelização”.

 O Código Tributário Municipal prevê o aumento da alíquota à medida que aumentam os serviços públicos. “Por exemplo, a coleta de lixo aumenta alíquota do condomínio. Mas se está em obras, não tem coleta de lixo. A prefeitura quer arrecadar e a sociedade está revoltada”, diz Rubens.

Ainda de acordo com o empreendedor, a prefeitura apresentou projeto para alterar o Código Tributário, permitindo aumento do IPTU sem passar pela consulta à Câmara Municipal de Campo Grande.

Alíquota transitória - As alíquotas do IPTU incidem sobre o valor venal e variam conforme o tipo e o uso do imóvel, bem como a presença de melhoramentos públicos efetivos (pavimentação, água, esgoto, iluminação, equipamentos e serviços públicos).

De acordo com perícia contratada pela Câmara Municipal para subsidiar a audiência pública “Imóveis, o Impacto no IPTU e ITBI” , nos casos dos empreendimento de alto padrão, a presença de serviços internos, segurança, áreas verdes e controle de acesso naturalmente eleva o valor de mercado dos lotes, justificando uma base de cálculo mais robusta.

Projeto de IPTU vira alvo sob argumento de insegurança jurídica que ameaça obras
Levantamento mostra valor do IPTU em condomínio de luxo com alíquota progressiva. (Foto: Reprodução)

A alíquota do IPTU varia de 0,5% a 3,5% sobre o valor venal. O índice de 0,5% é para imóveis, em que não é oferecido nenhum serviço ou melhoramento público. Já o de 3,5% se aplica onde há três ou mais melhoramentos públicos oferecidos pelo município.

O documento mostra que, no caso de um terreno que custa R$ 2.188.586,82, com área de 746,24 metros quadrados, localizado no loteamento de luxo Lieu Unique, Jardim Veraneio, o valor do IPTU tem grande variação a partir da alíquota escolhida.

Se for de 1%, conforme o que tem sido aplicado em decisões do Tribunal de Justiça, o imposto custa R$ 21.885,87. Caso seja aplicada a alíquota de 3,5%, o IPTU sobe para R$ 76.600,54.

O Campo Grande News recebeu informação de que, inclusive, essa possibilidade levou à desistência das vendas dos terrenos, o que foi negado pela Plaenge, proprietária do empreendimento.

"A Plaenge informa que a informação não é verdadeira e que não houve devoluções de lotes por conta do IPTU", diz a nota encaminhada à reportagem.

Segundo o estudo do Nuperj (Núcleo de Perícias Judiciais), o Projeto de Lei Complementar 7/2025 cria alíquota transitória para terrenos em loteamentos fechados, classificados pela legislação municipal como categoria L3 (caso do Lieu Unique). O texto define alíquota de 1% nos três primeiros anos, prorrogável uma única vez e elevada progressivamente até atingir 3,5%.

O vereador André Salineiro (PL) apresentou emenda que amplia o prazo para loteamentos fechados pagarem alíquota de 1% de IPTU de três anos para sete anos. Salineiro também quer incluir no projeto dispositivos que obrigam a prefeitura a garantir o direito de defesa antes de qualquer majoração de imposto.

Projeto de IPTU vira alvo sob argumento de insegurança jurídica que ameaça obras
Simone Leal é vice-presidente do Conselho Regional dos Corretores de Imóveis. (Foto: Divulgação)

“Quem mais perde é Campo Grande” - A vice-presidente do Creci-MS (Conselho Regional dos Corretores de Imóveis), Simone Leal, afirma que empresários do setor da construção civil têm manifestado preocupação com a aplicação da alíquota progressiva de IPTU em loteamentos de Campo Grande.

“Essa tributação tem gerado insegurança jurídica, levando investidores a repensarem seus projetos na cidade. O setor imobiliário defende maior clareza nas regras e um diálogo mais amplo entre prefeitura, Câmara Municipal e empreendedores, para garantir um ambiente mais estável e propício ao desenvolvimento econômico. Quem mais perde é Campo Grande, que está no caminho inverso do progresso”, afirma a dirigente do conselho.

Insegurança jurídica – Parecer da OAB/MS reforça que o projeto 07/2025 afronta dispositivos da legislação federal.

“A lei federal do parcelamento do uso do solo é clara ao vincular a incidência do IPTU, por meio de inscrições individualizadas, à efetiva conclusão da obra, que deve ser atestada pela expedição do termo de verificação de obras. Antecipar a cobrança individualizada antes desse marco é transferir ao contribuinte uma obrigação sem que exista a condição legal para tanto, gerando desequilíbrio e insegurança no mercado imobiliário”, afirma o presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB, Marcelo Vieira.

Projeto de IPTU vira alvo sob argumento de insegurança jurídica que ameaça obras
Marcelo Vieira é presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB. (Foto: Gerson Walber)

Conforme o especialista, outro ponto sensível é a autorização para atualizar a base de cálculo do IPTU por meio de decreto, sem critérios objetivos previamente definidos em lei.

"A medida abre espaço para reajustes sem balizas claras, em desacordo com os princípios da legalidade e da transparência, fragilizando a segurança jurídica dos contribuintes. Se mantidas tais disposições, a consequência inevitável será o aumento da judicialização, com prejuízos tanto para os contribuintes quanto para a própria arrecadação pública” destaca Vieira.

Projeto de IPTU vira alvo sob argumento de insegurança jurídica que ameaça obras
Terrreno em loteamento no Jardim Veraneio, em Campo Grande. (Foto: Henrique Kawaminami)

Capacidade contributiva - Apesar das críticas, a Prefeitura de Campo Grande nega que há progressividade da alíquota do imposto.

 “O que está sendo proposto é uma medida de incentivo à construção, atendendo à demanda dos proprietários desses terrenos. Para isso, sugere-se a redução da alíquota de 3,5% para 1%, por prazo determinado, incentivando as construções. Esclarecemos que, ainda que as atualizações possam ocorrer por meio de decreto, sempre haverá apresentação do estudo técnico à Câmara Legislativa, para ciência e eventuais deliberações”, informa o diretor executivo da Receita da Sefaz (Secretaria Municipal de Fazenda), Ricardo Vieira Dias, por meio de nota enviada à reportagem.

De acordo com ele, o projeto busca corrigir diferenças de lançamento do IPTU entre imóveis com as mesmas características, situação frequentemente apontada em audiências públicas. As diferenças decorrem do fato de que os valores vêm sendo atualizados apenas pelo índice IPCA-E (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial), sem a correspondente atualização da Planta Genérica de Valores.

“Ressaltamos, por fim, que as atualizações cadastrais respeitarão o princípio da capacidade contributiva. Assim, os ajustes não terão impacto significativo de forma individual”, informa o diretor.

Verticalização judicializada – O setor da construção também é afetado por ações judiciais que questionam, principalmente, a construção de prédios.

Em 2023, a Associação Auditar Brasil pediu liminar para que a Justiça suspendesse as GDUs (Guias de Diretrizes Urbanísticas) expedidas em 65 processos administrativos de obras que tramitavam na Planurb (Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano).

As construtoras apontaram insegurança jurídica e risco de demissão em massa. Uma única empresa, que tinha três empreendimentos na lista com pedido de suspensão, apontou prejuízo de R$ 521 milhões. A liminar chegou a ser deferida, mas o Tribunal de Justiça derrubou a decisão. A última movimentação da ação foi em 2 de setembro, quando o MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) pediu o prosseguimento do processo para decisão final.

A reportagem apurou que os investidores já contabilizam o que chamam de “custo Campo Grande”, que faz com que construir na Capital seja mais caro do que em Cuiabá ou Goiânia, por exemplo.

A avaliação é de que Campo Grande tem legislação muito proibitiva para os empreendimentos, além da demora na avaliação pelo poder público. A comparação indica que o aval pode demorar até cinco anos, enquanto que em outras capitais o tempo é de um ano e meio.

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