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Em Pauta

Estradas para lugar algum: transamazônica e transpantaneira

Por Mário Sérgio Lorenzetto | 23/12/2024 07:08
Campo Grande News - Conteúdo de Verdade

Foi no governo Médici (1.969 - 1.974) que a transamazônica começou a rasgar a floresta com maior biodiversidade do mundo. Era 9 de outubro de 1.970, e o presidente se encontrava em Altamira, no Pará, para lançar oficialmente o início das obras da rodovia. Uma “obra faraônica”, trombeteavam os jornais. Derrubaram uma castanheira com mais de 50 metros de altura para colocar a placa de inauguração. O local é conhecido, até hoje, como o “pau do presidente”. A ideia de construir a rodovia surgira alguns meses antes, após o início de uma viagem de Médici ao nordeste açoitado por uma seca perversa. Médici achou que seria uma boa ideia deslocar milhares de nordestinos empobrecidos para “colonizar” a Amazônia.


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O gigantismo sonhado e atolado.

A estrada teria 8 mil quilômetros, unindo a Paraíba à fronteira amazônica com o Peru. Das 100 mil famílias, restaram 8 mil, quando a estrada foi abandonada. Mesmo número de indígenas faleceu nessa época nas proximidades da tentativa de construir a estrada. O Incra repassaria ao chefe de cada família, além dos custos de deslocamento, uma casa e um salário mínimo durante seis meses. Nos planos do governo, 75% dos colonos seriam nordestinos e 25% sulistas. A cada 5 quilômetros haveria estradas vicinais, cortando a estrada principal. A cada 15 quilômetros haveria uma agrovila, com pequenos serviços e feira para os produtores. A cada 50 quilômetros, uma “agrópolis”, comum centro medico e escolas. Tudo em vão. A estrada atolou em seu gigantismo. Apenas uma promessa a mais, nunca cumprida. Uma estrada para lugar nenhum.


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A irmã menor era a Transpantaneira.

A Transpantaneira foi iniciada em 1.972. Fazia parte do mesmo ideário do governo Medici. As obras começaram em Poconé, no vizinho Mato Grosso. Foram quatro anos de desventuras, chegando onde hoje é o Porto Jofre, local cobiçado por pescadores. No plano original, a Transpantaneira teria ao todo 397 quilômetros, ligando Poconé a Corumbá. O objetivo principal era transportar gado para as fábricas de processamento do sul do país.


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Do ufanismo ao esquecimento.

A estrada nasceu celebrada com ufanismo comparável a duas outras obras: a ponte Rio-Niterói e a Transamazônica. Implantaram um pouquinho de revestimento primário - cascalho. O aterro foi construído com o solo vizinho da estrada. A retirada do solo formou grandes bacias ao longo da mesma, servindo como reservatório de água para vaca no período de seca. Só que o sonhado “caminho do paraíso” revelou-se mais cheio de dificuldades do que previam. O que restou foi um pedaço de estrada com uma característica impossível de imaginar: ao longo de seus 127 quilômetros, são 120 pontes. Uma ponte a cada quilômetro. Até a pouco, 83 dessas pontes eram de madeira, exigindo conservação anual. Dizem que é a estrada com mais pontes no mundo. Outra estrada planejada para ir a lugar algum. Mas há salvação para a nossa. É possível que, no futuro, se transforme em um dos lugares mais importantes para avistamento de aves do mundo. Quem diz são os números. Nada menos de 95% dos turistas que por lá trafegam, são estrangeiros que desejam observar aves.

 

Os artigos publicados com assinatura não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem como propósito estimular o debate e provocar a reflexão sobre os problemas brasileiros.

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