Jabuca na Festa do Divino nas Três Barras e os foguetes de rabo
Em meados do século passado, a região das Três Barras pertencia à zona rural de C.Grande. Era um lugar ermo, distante do centro da cidade. Por lá, vivia Jabuca, o anjo bom. Porque era puro de espírito. De todos, procurava suavizar a dor martirizante. Por isso o queriam e adoravam. Tinha um coração maior que a lua cheia.
O crucifixo no peito.
Jabuca trazia no peito um enorme crucifixo. Presente da madrinha. A preta ex-escrava que o criara. Aquela que morrera no engenho, dentro do tacho fervente, no derradeiro dia da safra. Arrancara do pescoço da madrinha a imagem sagrada e dela fizera o guia sublime.
Jabuca na Festa do Divino.
Quando chegava a Festa do Divino, era de se ver a capacidade do Jabuca. Girava mais que um corrupio. Padre babava de gosto. Jabuca providenciava tudo: folhas de palmeira, flores, capim santa-fé e samambaias para o enfeite dos arcos. Guardava as prendas para o leilão. Juntava pedregulhos para tapar os buracos da pequena pracinha em frente à igrejinha. Carreara lenha para o assado. Providenciava a mandioca. Ajeitava bancos aqui e ali com lascas de peito-de-pomba. Reunia a gurizada para rebocar a igrejinha. Vinha o outro ano e verificava-se a mesma azáfama.
O sonho de construir uma igreja de tijolos.
Mas a Festa do Divino tinha uma finalidade muito nobre: conseguir recursos para a construção de uma igreja de tijolos, com escadas, porta de entrada bem larga, uma torre para o sino, quartinho para batizado, confessionário e um púlpito. Parecia que a festa era mais do Jabuca que do padre. Mas uma coisa era certa: a festa não saia sem o Jabuca. Era o estrategista, o orientador, o guia e operário.
Os foguetes de rabo.
Uma coisa aguçava a curiosidade do povaréu: os foguetes de rabo que o padre adquirira no centro da cidade para iluminar o céu na noite festiva. Falavam em uns que formavam um chuveiro de cores, imitando as estrelas do céu. Mas o que o povo mais gostava era o foguete que soltava um disco de fogo, muito mais bonito que a lua cheia. Na tarde, formavam a procissão. Havia ordem, respeito e e compenetração. E isso alegrava o coração do padre, que seguia na frente puxando o cortejo, entoando cânticos e rezando. E veio a noite. A igreja não comportou a multidão. A pracinha ficou apinhada. O padre fez o sermão. Estava emocionado. Tinha voz embargada. Era o divino pranto. Ao lado do altar, um moço chorava: era Jabuca.
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