Aos 105 anos, último pracinha vivo de MS é o herói da família
Combatente participou da 2ª Guerra Mundial, na primeira tropa expedicionária da FEB enviada à Itália, em 1942
À beira dos 105 anos, Justino Pires de Arruda, conhecido como "pracinha de Amambai", é o herói da família. O soldado expedicionário do Primeiro Escalão da FEB (Força Expedicionária Brasileira) é o último "pracinha" vivo de Mato Grosso do Sul. Centenário em experiências e lucidez, o combatente completará mais um ano de vida ao lado de parentes e amigos nesta quinta-feira (12). Apesar da data, ele soprou as velinhas adiantado este ano, no dia 7.
Cleuza de Arruda Lopes, de 64 anos, filha do meio de sete irmãos – seis vivos e um falecido – relata que o pai é o orgulho da família pela história, luta e longevidade. “É uma benção, porque ninguém consegue chegar a essa idade como ele, com saúde e lúcido. Para nós, ele é um herói, porque ir para uma guerra e voltar com vida é uma bênção. Ele levou uma bomba na cabeça, mas, por sorte, só levou um arranhão, pois estava com capacete de aço.”
Justino não compartilha muitas memórias da guerra com frequência. A filha, que falou com o Lado B devido ao pai estar adoentado – nada grave, segundo ela – comenta algumas das coisas que conseguiu puxar da memória.
“Ele não fala muito sobre a guerra, só que foi muito triste, que muitos colegas morreram. Conta algumas coisas do que viveu lá, como o navio que o levou para a Itália. Diz que muitos companheiros passavam mal por não ter experiência no mar. Ele ficou um ano lá, e a guerra já tinha começado quando chegou.”
Aqui, é preciso uma pausa no relato para explicar o contexto. No dia 2 de julho de 1944, o 1º Escalão da FEB embarcou no navio de transporte de tropas norte-americano "USS General W. A. Mann". Justino partiu rumo à região da Toscana, Itália, junto a outros 5.074 companheiros.
O objetivo era vencer as tropas nazistas de Hitler. Os brasileiros foram convocados para o maior confronto bélico da história em 1942, três anos após o início da 2ª Guerra Mundial. Ele participou ativamente das batalhas de Monte Prano, Zocca, Camaiore, Montese, Colechio e da rendição da 148ª Divisão de Infantaria Alemã, em Fornovo di Taro.
No dia 4 de novembro de 1944, na região de Palazzo, Justino foi atingido por uma bomba lançada pelos soldados inimigos. Os estilhaços perfuraram o capacete de aço e atingiram sua cabeça de maneira superficial. O combatente brasileiro retornou ao solo nacional em 18 de julho de 1945, três meses antes do fim absoluto do conflito.
Cleuza ressalta que, apesar do reconhecimento atual, ao regressarem da guerra, os pracinhas tiveram que travar outra luta, dessa vez pelo direito à aposentadoria.
“Pena que agora são valorizados, porque antes eles não tinham valor. Agora que ele aparece mais, antes não aparecia, não tinha nada, nenhuma assistência. Eles tiveram a oportunidade de procurar emprego nos Correios, mas, como ele morava na fazenda, não tinha como encontrar”.
Ela completa que Justino demorou para conseguir o reconhecimento e ser aposentado. "Andou bastante atrás do direito dele. Em 1970, ele veio para Ponta Porã, onde moramos, arrumou emprego no quartel para fazer café e ficou encostado. Depois leu no Diário Oficial que tinha direito à aposentadoria. Tem alguns em Campo Grande que não tinham nenhuma ajuda, nem souberam disso".
Justino ganhou inúmeras medalhas de honra ao mérito, entre elas a Medalha de Campanha da Força Expedicionária Brasileira, a Medalha Sangue do Brasil, por ferimento em combate, a Medalha do Mérito Força Expedicionária Brasileira, da Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul, a Medalha da Vitória, do Ministério da Defesa, entre outras.