“Deve ser último recurso”, diz senadora Tereza sobre uso da Lei de Reciprocidade
Relatora da lei volta a defender diálogo como saída à tarifa de 50% imposta por Trump a produtos brasileiros

Em meio às tensões entre Brasil e Estados Unidos, que já impactam o mercado frigorífico de Mato Grosso do Sul, a senadora sul-mato-grossense Tereza Cristina (PP-MS), relatora da Lei da Reciprocidade, afirmou nesta quarta-feira (16) que a norma “deve ser o último recurso” a ser usado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em resposta à sobretaxa de 50% imposta pelo presidente estadunidense Donald Trump (Partido Republicano) a produtos brasileiros.
RESUMO
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A senadora Tereza Cristina (PP-MS), relatora da Lei da Reciprocidade, defende o diálogo com os Estados Unidos como prioridade ante à tarifa de 50% sobre produtos brasileiros imposta pelo presidente Donald Trump. A parlamentar considera a lei como último recurso, a ser utilizado após esgotadas as negociações diplomáticas. A medida afeta o mercado frigorífico de Mato Grosso do Sul, com suspensão de embarques e queda no preço da arroba do boi. Tereza Cristina alerta para o impacto econômico da tarifa, destacando a dificuldade de realocar a carne bovina, usualmente exportada para os EUA, para outros mercados. A senadora defende a negociação direta entre os presidentes Lula e Trump, visando evitar prejuízos ao PIB brasileiro e desemprego. Uma comitiva do Senado está sendo articulada para discutir o tema com parlamentares norte-americanos. A senadora também sugere a inclusão de outros temas comerciais na pauta de negociações, como cotas de etanol e açúcar.
"Na lei da reciprocidade, você tem várias escalas de negociação até chegar à mais punitiva”, argumenta a senadora, que foi relatora da lei. “Eu continuo achando que a lei da reciprocidade é o último instrumento, a ser usado depois que o diálogo se esgotou, quando não há mais possibilidade de discutir. Aí, sim, você tem uma ferramenta que passa a ser uma questão de interesse nacional, do Estado brasileiro”, afirmou a senadora em entrevista à Globo News, na manhã de hoje (16).
Previsto para entrar em vigor em 1º de agosto, só o anúncio do “tarifaço” já levou frigoríficos de Mato Grosso do Sul a suspenderem o envio de cargas para o país norte-americano, conforme confirmou o setor ontem. Segundo Tereza, o impacto econômico imediato recai sobre um dos setores mais importantes da economia do Estado e já levou à queda no preço da arroba do boi.
Na visão dela, é possível que o mercado interno não absorva a carne que era exportada para os EUA. “Essa história de que essa carne vai ficar no mercado interno não é verdade. São retalhos, carne magra usada para fazer hambúrguer, para fazer o mix lá fora, porque a carne deles é muito mais gorda que a nossa. Então, para diminuir a gordura do hambúrguer, eles precisam da nossa carne magra, que tem bom preço e volume. Isso é muito difícil de redirecionar para outros países. Enfim, não existe isso de realocar com facilidade”, explicou.
Entretanto, a senadora alertou que o prejuízo pode se agravar e menciona que importadores estadunidenses já estão pedindo para não embarcar. “Porque se embarcar e vier o embargo, essa carne fica nos contêineres refrigerados, que custam caro, parados no porto ou no navio”, comentou.
Ela relembrou que esse cenário já foi vivido nos últimos anos, durante a pandemia de Covid-19. “Tivemos muitos problemas com a China por causa da Covid. A carne ficava embarcada, e o navio não sabia onde aportar. Isso tem um custo enorme para a indústria frigorífica brasileira. Eu espero que a gente não chegue a esse ponto. E volto a dizer: o governo precisa rever tudo. Vai ser um prejuízo enorme para o PIB brasileiro. Vamos ter problemas graves na nossa economia”.
Apesar do cenário adverso, especialistas como o professor Aldo Barrigosse já ponderaram que o movimento de Trump, que afeta ao menos 40 países com taxas variadas, pode abrir novas janelas de oportunidade. “É preciso estar preparado para coisas piores, mas também para surfar em oportunidades”, avaliou.
Para Tereza, a saída mais viável ainda é a diplomacia, e inclusive, o diálogo direto entre os chefes de Estado. “É preciso um negociador de peso. Acho que o presidente Lula entende a gravidade da situação, porque, se isso acontecer, os reflexos já começam a aparecer, acabamos de ver impactos nas exportações, e isso vai gerar desemprego no Brasil. É uma situação muito séria. Portanto, acredito que o presidente Lula deveria ligar, tentar um contato direto, fazer um pedido, não sei se isso já aconteceu”, diz. “É hora de voltar à mesa e negociar”, complementa a senadora.
Em relação aos EUA e a divergência política entre o governo Trump e o governo Lula, ela menciona que “o Brasil precisa estar acima das ideologias”. Tereza diz que o Brasil “será o mais prejudicado” se não abrir o diálogo e tentar barrar essas alíquotas de 50%.
“Estamos falando de um tema que é gravíssimo para a economia brasileira, e que também afeta a economia americana. Só que os Estados Unidos são a maior potência mundial, e nós não podemos entrar nessa briga de peito aberto, porque vamos perder. Não tenho dúvida, acho que ninguém tem. O Brasil será o maior prejudicado se não abrir diálogo e tentar barrar essas alíquotas de 50%, que inviabilizam completamente a nossa competitividade no mercado internacional”, disse a senadora.
Ela também mencionou que nessa negociação ainda há outros temas comerciais que podem ser levados à mesa, como a cota do etanol e açúcar para compra. Hoje, 60% do etanol importado pelos EUA é produzido no Brasil, segundo dados do USDA (Departamento de Agricultura dos EUA), de 2024.
“Somos os maiores produtores e exportadores de açúcar do mundo. Negociar cota de açúcar e etanol é fundamental. Temos uma série de questões que precisam ser colocadas à mesa para essa discussão, para que a gente possa retomar as negociações. Eu brinco que é como colocar a bola de novo no campo. Hoje está todo mundo jogando futebol de base, cada um chutando para um lado. A gente precisa trazer a bola para o centro do campo e recomeçar essa conversa, entender o que o Brasil pode perder menos”, opina Tereza.
Viagem aos EUA - Tereza Cristina também confirmou que o Senado articula uma comitiva oficial para os Estados Unidos. A ideia é estabelecer um canal direto entre parlamentares brasileiros e norte-americanos para discutir os impactos da medida anunciada por Trump.
A senadora afirmou que está em diálogo com o senador Nelsinho Trad (PSD-MS), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, para definir os nomes e o cronograma da viagem.
“Se essa comissão for aos Estados Unidos, será por via institucional, através da embaixada dos EUA aqui no Brasil. Já estão marcando reuniões com parlamentares lá. Essa é uma comissão de parlamentar para parlamentar, ou seja, Senado brasileiro com Senado americano. Se for marcada, ela deve acontecer na última semana de julho, até porque o prazo que nós temos é 1º de agosto, ou se dá um tempo maior para essas discussões, ou vêm as sanções a partir de 1º de agosto”, compartilha a senadora.
"Questão interna" - A senadora, que já foi ex-ministra Agricultura, Pecuária e Abastecimento no mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), disse “que entendia o lado” do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que no momento está morando nos EUA, e é alvo de um inquérito da Polícia Federal que investiga a atuação dele nos Estados Unidos.
“Eu sempre me coloco no lugar do outro, para entender a reação da pessoa. Ele [Eduardo Bolsonaro] está agindo como filho, preocupado com o seu pai, se sentindo perseguido, injustiçado. Então ele está colocando a anistia, mas eu acho que isso é um problema interno, que nós temos que discutir no Brasil: como é que vamos tratar esse assunto da anistia e do julgamento de todos os que estão aí, que foram indiciados anteontem pelo Supremo e pela PGR. Então esse é um assunto interno”, opina Tereza.
Mesmo com a atuação de aliados de Bolsonaro tentando vincular a defesa de anistia ao recuo das tarifas, Tereza avalia que misturar os dois temas pode prejudicar o país. “Agora, o assunto do comércio, eu acho que nós temos que começar a separar. O problema é vincular. Ele está fazendo essa vinculação. O Bolsonaro está numa campanha para defender o pai, mas ele mesmo reconhece que isso pode ser contra o Brasil.”
Sobre a influência de Eduardo Bolsonaro no governo Trump, Tereza minimizou a influência direta do deputado nas negociações. “Eu não sei o nível de interlocução que o Eduardo Bolsonaro tem com o governo Trump. Eu sei que ele é amigo da família, mas a gente sabe que o Trump está tratando esse assunto com todo mundo. Não é só com o Brasil. Ele só adicionou uma pitada a mais na relação com o Brasil”, concluiu.
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