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Falta de registro pela Anvisa não deve comprometer questão de medicamentos

Por Luciano Correia Bueno Brandão (*) | 07/11/2016 09:26

Pendem de julgamento no STF (Supremo Tribunal Federal) dois recursos nos quais se discute se o Estado é obrigado a fornecer remédios de alto custo ou sem registro nas listas do SUS e da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) a quem não pode pagar. A questão é de fundamental importância e de impacto direto na vida de milhares de pacientes que dependem do acesso de medicamentos através do SUS e repercute, indiretamente, também sobre o dever de os planos de saúde privados custearem medicamentos ainda sem registro na Anvisa, tema este que suscita acaloradas discussões judiciais.

Inicialmente, o ministro relator Marco Aurélio Mello havia definido que o Estado não poderia ser obrigado a fornecer um medicamento sem registro nos órgãos competentes. Devido à enorme repercussão do caso, o ministro alterou seu voto, passando a admitir que medicamentos ainda não registrados no Brasil, mas devidamente testados e certificados no exterior, podem ser fornecidos pelo Poder Público.

A verdade é que a questão suscita e enseja inúmeras discussões, não apenas de ordem jurídica mas até mesmo ética. É legítimo garantir o fornecimento de medicamentos apenas aos comprovadamente hipossuficientes? A Constituição garante a saúde como direito de todos. Não há na lei observação de que somente os pobres devem gozar da tutela do Estado. Alguém que goze de melhor condição financeira deve ser obrigado a suportar às próprias expensas a aquisição de determinado medicamento de alto custo, mesmo quando paga seus impostos e deveria, em tese, obter amparo do Estado em caso de necessidade?

A tais dilemas, se somam outros como a administração sustentável dos recursos do Estado. Como atender a contento uma altíssima demanda de medicamentos de alto custo com recursos limitados? Muitos invocam, neste caso, o "princípio da reserva do possível", como uma forma de limitar a responsabilidade do Estado dentro de critérios de razoabilidade. Por fim, como mencionado antes, também os planos de saúde poderão sofrer impacto indireto. Hoje, há milhares de ações judiciais em trâmite no Brasil nas quais se discute, exatamente, o dever dos convênios arcarem com o custeio de medicamentos importados prescritos a seus beneficiários, alguns deles ainda não registrados na Anvisa, sendo importante anotar que, na enorme maioria das decisões, o Judiciário tem reconhecido o dever de fornecimento.

Fato é que a questão deve ser analisada sob múltiplos aspectos e não cabem respostas simplórias. Medicamentos ainda não registrados na Anvisa não devem ter o seu fornecimento sumariamente descartados, seja pelo Estado seja pelos planos de saúde privados. Com efeito, se determinados medicamentos tem sua eficácia comprovada por meio de estudos clínicos reconhecidos pela comunidade médica (inclusive internacional), não haveria motivo pelo qual não admitir o seu acesso a pacientes no Brasil.

Vale dizer, se determinados remédios já foram aprovados em órgãos de saúde no exterior, como Estados Unidos e Europa e são reconhecidos como eficazes, o paciente brasileiro não pode ser penalizado pela simples falta de registro pela Anvisa e demais órgãos regulamentadores nacionais, que em muitos casos decorrem de burocracia injustificada.

Obviamente alguns critérios podem ser estabelecidos para regulamentar as circunstâncias e condições para o fornecimento de tais medicamentos, mas em última análise, negar acesso a tais medicamentos - seja pelo SUS, seja pelos planos de saúde -, em virtude única e exclusivamente da falta de registro nacional não nos parece razoável e os eminentes Ministros do STF parecem sinalizar entendimento neste sentido. Quem viver, verá.

(*) Luciano Correia Bueno Brandão é advogado especialista em Direito à Saúde

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