O espelho da inteligência artificial
"A alma que se afasta da natureza e da quietude perde a capacidade de lembrar quem é." Lao Tsé.
Com o abandono do espírito surgiu o sonho da tecnocracia, usando o intelecto para construir um sistema cujo objetivo é conquistar riqueza, poder e controle, tanto no Capitalismo de Mercado, como no Capitalismo de Estado, este último atuando com a força centralizadora do poder. Em épocas remotas, os povos mais fortes aprisionavam os mais fracos. Roma e Grécia faziam dos prisioneiros seus escravos. Inglaterra e Europa capturaram as tribos da África. Com os avanços da IA, o projeto da dominação poderá se estender sobre os pequenos negócios e empreendimentos, e sobre toda a humanidade de baixa renda.
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A tecnologia por si só não é boa nem má; tudo depende de como e por quem ela é utilizada. Em mãos ambiciosas e com interesses concentrados em lucro e controle, a IA pode, sim, acentuar desigualdades. O problema não é a inteligência artificial; é o vazio espiritual que se instalou antes dela. A tecnocracia não brotou do silício, mas da ausência de sentido que levou o ser humano a um viver mecânico.
A ameaça não está nos algoritmos, mas na desconexão que já vinha corroendo o tecido espiritual da humanidade. A tecnocracia nasceu do vazio espiritual, do abandono da contemplação, da pressa de dominar o mundo sem antes compreendê-lo. Criamos máquinas sem ter entendido a vida, sem senti-la em sua amplitude.
Ao esquecer que o espírito retorna várias vezes em outro corpo para prosseguir o seu estágio evolutivo na Terra, valorizamos o intelecto sobre a intuição, a performance sobre o silêncio interior. Ao perder contato com o invisível, criamos máquinas que refletem esse mesmo distanciamento. Não é a IA que ameaça a essência humana, mas sim a ausência de propósito maior que antecede essa revolução.
O afastamento da espiritualidade, entendida como a essência que busca a compreensão do significado e finalidade da vida, transformou o ser humano em engrenagem. A tecnocracia, quando descolada de princípios éticos e de valores humanos, traz como resultado o viver automatizado, onde decisões são tomadas por parâmetros de desempenho, e o tempo para introspecção se torna luxo. A IA, nesse cenário, é apenas o reflexo do enrijecimento já em curso devido à perda da naturalidade.
Os seres humanos estão ocupados com a sobrevivência na selva de pedra e com as ninharias da vida. IA não é apenas uma ferramenta de consulta, mas também é um espelho que devolve ao ser humano a profundidade com que ele decide olhar o mundo. Cada pesquisador enxergará a extensão do que lhe é apresentado até onde sua restrição pessoal lhe permitir. A inteligência artificial pode servir à superficialidade ou à sabedoria. A escolha está no modo como a utilizamos. Quando bem manejada, ela expande horizontes; quando usada como muleta, ela restringe a visão.
Quando nos libertamos das tarefas mecânicas, cultivando a quietude, poderemos dedicar atenção ao essencial. Quando damos uma parada para apreciar a natureza em sua pujança, quando acessamos os saberes esquecidos da voz interior, poderemos despertar a nossa escuta. Quando cultivamos o silêncio poderemos, enfim, ouvir o murmúrio da alma esquecida.
A IA funciona como um espelho revelador. Reflete não apenas os dados que inserimos, mas os valores, intenções e profundidade com que decidimos enxergar o mundo. Por outro lado, essa nova tecnologia poderá reduzir a capacidade de discernir e de ampliar a visão dos indolentes, por isso deve ser utilizada de forma inteligente. Antes de fazer consultas, devemos nos inteirar dos aspectos da questão que queremos tratar; assim surgirão novos ângulos que não tinham sido percebidos.
A tecnologia não precisa ser oposição à espiritualidade; pode ser a ponte, o portal. Depende da intenção com que é usada, da lucidez intuitiva de quem a guia. Ademais, há uma chance rara e potente neste instante da história para usar a inteligência artificial não para nos automatizar, mas para nos lembrar que somos criaturas que têm de buscar o saber. Quem somos? De onde viemos? Para onde vamos? É indispensável procurar e encontrar as respostas para essas questões para que possamos nos tornar autênticos seres humanos.
Obs.: a elaboração deste artigo foi feita com consultas ao Copilot, a IA da Microsoft.
(*) Benedicto Ismael Camargo Dutra, graduado pela Faculdade de Economia e Administração da USP
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