Enquanto tenta se acostumar com muletas, gari com perna amputada pede justiça
Felipe da Silva estava trabalhando quando um motorista embrigado atingiu o caminhão, mas não foi preso
Mais de um mês após o acidente que custou uma perna para o gari Felipe da Silva, 24 anos, ele e a família seguem sem andamento no inquérito do motorista Mario Barbosa Neto, 29, que atingiu o trabalhador durante a madrugada do dia 12 de março, por volta das 4h, no Bairro Carandá Bosque, em Campo Grande.
Era para ser mais um dia comum de trabalho para o gari, que havia sido contratado há apenas seis meses, mas a tragédia mudou para sempre o destino dele e de sua família.
Felipe estava no caminhão estacionado e esperava um colega terminar de coletar resíduos na rua, quando um carro em alta velocidade, e aparentemente desgovernado, surge e o prensa entre os dois veículos. Felipe teve diversas fraturas e precisou amputar a perna esquerda.
“A gente nunca imagina que vai acontecer. Eu só não vi a hora que o veículo veio, porque estava de costas na plataforma, mas o resto eu lembro de tudo. O impacto foi tão forte que o veículo foi um pouco para trás”, disse.
Com a rotina mudada repentinamente, Felipe ainda tenta se adaptar. Ele relata que ainda não se acostumou a usar as muletas e tem problemas de equilíbrio. Os olhos ficam marejados ao lembrar das cenas do acidente, e a indignação aparece na fala quando é questionado sobre o andamento das investigações.
“Eu ainda fico relembrando as imagens na minha cabeça e ainda tem que se acostumar com tudo isso, é difícil. Às vezes, a gente quer fazer as coisas sem ajuda das pessoas e não consegue. Minha filha completou um ano quando eu ainda estava internado no hospital, agora, ela começou a andar e não dá para acompanhar ela de muletas. Quero pegar no colo e não consigo. Mas graças a Deus pela minha vida, só com o tempo para se acostumar.”
Pessoas que testemunharam o acidente relataram que o motorista apresentava sinais de embriaguez, como desorientação e olhos avermelhados.
“Ele desceu do carro e parecia que não sabia nem onde estava, estava bastante atordoado, bêbado. É uma irresponsabilidade, porque a gente estava trabalhando, certo que podia ser qualquer um, mas de qualquer forma, é uma responsabilidade terrível”, completou Felipe.
Na casa da família, três pessoas dependem da renda do gari: a esposa, a sogra e a filha de um ano. Agora, ele espera a perícia do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) para se aposentar por invalidez. Enquanto não realiza o exame, continua recebendo salário e os benefícios da Solurb, concessionária responsável pela limpeza urbana da Capital.
“A justiça tem que ser feita, é a lei. Um cara desse, acredito que seja um perigo para a sociedade, porque nem foi homem para ficar e assumir o que fez, está achando que o que ele fez foi brincadeira, não tem justificativa”, disse ainda o gari.
Sem respostas - No dia do acidente, o motorista foi conduzido para a Santa Casa de Campo Grande para receber atendimento médico, mas em seguida, foi liberado e não fez teste do bafômetro. Felipe ficou 16 dias internado e só foi aberta investigação policial para apurar o atropelamento quando ele recebeu alta e procurou o advogado Vinicius Pizetta.
“É a Lei Seca. Se ele está bêbado, ele faz o teste do bafômetro, é preso e é encaminhado para a delegacia. É um descaso muito grande, o caso do Felipe está sendo tratado com um descaso fora do comum”, apontou o advogado.
Apenas o Corpo de Bombeiros e a BPMTran (Batalhão de Trânsito da Polícia Militar do Estado de Mato Grosso do Sul) registraram boletim de ocorrência, mas não foi registrado na Polícia Civil.
Pizetta explicou que entrou com ação na Justiça e aguarda manifestação do Estado. Caso não haja, vai protocolar ação penal privada subsidiária pública.
O caso - Nas imagens, é possível ver que o rapaz termina de retirar os lixos da calçada, sobe no veículo e espera o amigo a recolher alguns resíduos que ficaram no chão. Enquanto aguarda alguns segundos, o motorista que trafegava na pista lateral à esquerda invade um pedaço da faixa e atropela o homem.
O colega fica desesperado e o motorista do caminhão desce para tentar ajudar. Já o autor tenta fugir, mas o veículo não responde. Depois, ele senta na calçada e chora.