Golpes e robôs afastam clientes do banco e reforçam medo do digital
Especialista afirma que dificuldades no atendimento violam os direitos do cliente
Tânia Souza ainda prefere ir até a agência bancária para resolver questões mais delicadas. Sentar diante da gerente, explicar com calma e sair com a certeza de que tudo ficou entendido. Para ela, a tecnologia agilizou muitos processos, mas também criou uma distância difícil de atravessar. “Você liga, aperta opção, passa por menu, e no fim continua com dúvidas”, relata.
RESUMO
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A automação de serviços tem se tornado uma barreira digital para muitos consumidores, especialmente idosos e pessoas menos familiarizadas com tecnologia. O problema se agrava quando envolve operações bancárias e financeiras, com casos relatados de golpes aplicados por telefone e dificuldades no acesso a atendimento humano. Especialistas em direito do consumidor alertam que, embora o avanço digital seja legítimo quando gera eficiência, torna-se ilegal ao impedir o acesso a soluções. Recomenda-se o uso de palavras-chave como "reclamação" e "ouvidoria" para acelerar o atendimento humano, além do registro de protocolos e acionamento de órgãos de defesa do consumidor quando necessário.
Embora reconheça que a tecnologia tende a avançar ainda mais nas próximas gerações, Tânia avalia que, no momento, ela segue sendo uma barreira para muitos usuários, especialmente para quem não consegue acompanhar esse ritmo de mudança.
O desconforto não é apenas uma questão de preferência. Tânia e o marido já foram vítimas de um golpe bancário que retirou R$10 mil da conta do casal. O valor passou a ser cobrado como se fosse um empréstimo contratado por telefone. Durante quase três anos, eles pagaram sem compreender o que havia acontecido. A situação só foi resolvida após orientação jurídica.
Desde então, Tânia evita confirmações verbais em ligações e desconfia de atendimentos que não permitem falar com uma pessoa. “O advogado me falou assim: Olha, muito cuidado quando você receber um telefonema, nunca fale ‘sim’ ou ‘concordo’. Tenha muita atenção. Por isso, eu tenho medo de ligações”, afirmou.
Exclusão - Para o advogado especialista em Direito do Consumidor Bruno Nogueira, esse cenário revela um problema mais amplo. “O que vemos hoje é uma barreira tecnológica que, na prática, se traduz em uma exclusão de direitos”, afirma. Segundo ele, o avanço digital é legítimo quando gera eficiência, mas se torna ilegal quando impede o consumidor de acessar uma solução. “Nenhuma empresa pode tratar o atendimento automatizado como resposta final.”
A insegurança relatada por Tânia também aparece na rotina de Vivia Dias dos Santos, administradora, que auxilia os pais, de 65 e 71 anos, no uso de aplicativos e serviços digitais. Ela conta que os dois utilizam pouco esse tipo de recurso e recorrem a ela sempre que precisam baixar um novo aplicativo ou resolver algo mais complexo. “Quando o atendimento é 100% automatizado, eles têm dificuldade”, explica.
Segundo Vivia, até mesmo o WhatsApp, que deveria facilitar, muitas vezes reproduz a lógica das centrais telefônicas. “Você passa por várias automações, espera muito tempo e, quando precisa falar com alguém, é um exercício de paciência”, diz..
Quando a demanda exige análise ou decisão, a barreira aparece. “Para pessoas mais velhas, isso vira um problema sério, principalmente pelo medo de cair em golpes”, explica Vivia ao lembrar que o pai de uma amiga, sem perceber, já fez um contrato de seguro via telefone que só foi descoberto meses depois.
Essa dependência de familiares é ainda mais evidente na casa da consultora de viagens Áurea Regiane, que vive com os pais. O pai, diagnosticado com Alzheimer, não consegue lidar com ligações ou aplicativos. A mãe, apesar de ativa nas redes sociais, evita serviços como transporte por aplicativo e cancelamentos bancários. “Ela tem receio”, afirma.
Áurea centraliza praticamente toda a rotina digital da família: marca consultas, solicita autorizações médicas, acompanha prazos e usa aplicativos de entrega. Ainda assim, diz que algumas situações continuam sendo desafiadoras. “Cancelar serviços ou falar com um atendente no banco é sempre complicado”, relata. Nessas situações, o controle financeiro fica com o filho, de 31 anos, que gerencia pagamentos e alterações.
Orientações - Para o advogado Bruno Nogueira, esse cenário exige atenção redobrada do consumidor. Ele orienta que, ao ficar preso em sistemas automatizados, a pessoa não deve aceitar o bloqueio como definitivo. “Palavras como ‘reclamação’, ‘cancelamento’, ‘operador’ ou ‘ouvidoria’ costumam acelerar o acesso a um atendente humano”, explica.
Caso não haja solução, a recomendação é registrar provas, acionar a Ouvidoria e recorrer ao Consumidor.gov.br ou ao Procon. De acordo com o advogado, a recusa em oferecer atendimento humano pode configurar infração administrativa e gerar direito à indenização.
Seguem dicas do advogado Bruno Nogueira sobre como agir no atendimento automatizado:
- Use palavras-chave: diga ou digite Reclamação, Cancelamento, Operador ou Ouvidoria para chegar a um atendente.
- Registre a tentativa: tire prints, anote horários e guarde o protocolo.
- Acione a ouvidoria: é um canal superior e tem obrigação de resolver o problema.
- Use o Consumidor.gov.br: plataforma oficial com resposta humana em poucos dias.
- Procure o Procon: empresas que dificultam o atendimento humano podem ser multadas.
- Nunca desligue sem protocolo: ele garante seus direitos em reclamações e ações.
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