Maioria, mulheres unem família e encabeçam produção de orgânicos
Aos 42 anos, casada, mãe de quatro filhos, produtora da agricultura familiar, Maria Aparecida é uma entre tantas Marias com o mesmo perfil: protagonista da própria história, construída com superação de desafios e confiança na própria capacidade.
Há seis anos trabalhando com a produção de orgânicos, Maria, o marido Altair e o filho Alexon, de 19 anos, tiram do sítio MV5A, no Polo de Orgânicos do Núcleo Industrial de Campo Grande (saída para Aquidauana), o sustento da família. Os dois irmãos mais velhos – Ademilson, de 25 anos, e Anderson, de 23 têm outras atividades. A caçula, Ângela, tem 10 anos.
Maria é natural de Ivailândia, distrito de Engenheiro Beltrão, no Paraná. Aos 2 anos chegou a Mato Grosso do Sul com a família, que se estabeleceu no Distrito de Itahum, em Dourados, a 233 quilômetros de Campo Grande. Mais tarde foi morar no assentamento Itamaraty para acompanhar o marido e com os filhos maiores, decidiram ir para a Capital.
Ligada ao PAS (Programa Alimento Seguro), programa desenvolvido por entidades do Sistema S, Maria foi beneficiada com um lote em comodato na região do Bálsamo e iniciou o trabalho com os orgânicos. Hoje, na área de 1 hectare do novo sítio, a produção é bem diversificada, com destaque para as hortaliças, mas “tem um pouco de tudo”.
A produção do sítio garante à família de Maria uma renda entre R$ 500 e R$ 600 por semana. A lida com a terra é a de sempre: em dia de feira, levantar mais cedo, colher e partir para a cidade. Nos outros dias, os tratos e cuidados que a produção certificada de orgânicos exige. “Trabalho é trabalho, mas o que a gente faz com amor não tem tanta dificuldade”, diz.
Maria conta com a ajuda do filho no trabalho, divide as tarefas com o marido e descreve o seguinte: “Um ajuda o outro. Eu sozinha não faria nada, assim como ele, sozinho, também não faria”.
Maria tecnológica – Se engana quem julga que o trato com a terra e a produção artesanal exigida pela cultura de orgânicos deixam Maria à margem do mundo moderno. Com clientela formada na feira da praça do Rádio, ela inaugurou neste sábado (7) o grupo “Feira de Orgânico” no aplicativo WhatsApp. Adicionou quem tem interesse e também quem já costuma frequentar a feira.
“É um modo de facilitar. Assim posso lembrar as pessoas que tem feira no dia seguinte, e também dá pra divulgar os produtos que vou levar para vender. Ou se alguém quer fazer uma encomenda, pedir para reservar alguma coisa, assim fica mais prático”.
Maioria – Maria integra a Organocoop (Cooperativa dos Produtores Orgânicos da Agricultura Familiar de Campo Grande) e faz parte de uma maioria: dos 63 associados à cooperativa, 40 são mulheres.
“As mulheres hoje encabeçam o setor da horticultura, principalmente a orgânica, porque acabam sendo mais sensíveis às questões ambientais e familiares. É uma característica feminina esse maior cuidado com a preservação, tanto do trabalho quanto do núcleo familiar”, avalia a engenheira agrônoma Karla Bethânia de Nadai, superintendente de Agronegócios da Sedesc (Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia, Turismo e Agronegócio).
A mesma avaliação faz a gerente de Orientação Empreendedora do Sebrae de Campo Grande, Lissandra Daudt Baron. “A mulher potencializa as características femininas, e a persistência é uma delas”, confirma.
Pesquisa - Um estudo feito pelo Sebrae em 2013 revela que Mato Grosso do Sul tem 103 mil mulheres empreendedoras nos diversos ramos de atividades econômicas, sendo que 28% delas estão nas micro e pequenas empresas. No Brasil, a maioria dos empreendimentos está sob o comando feminino e, na Região Centro-Oeste, esse percentual é de 56,5%.
A pesquisa mostra também que mudou o perfil da mulher empreendedora. Há pouco mais de dez anos, o empreendedorismo acontecia “por necessidade”, mas hoje é pela oportunidade que elas iniciam seus negócios. “ E elas só iniciam um empreendimento depois de muito estudo, muita análise, com segurança e embasamento”, assinala Lissandra.
Outro dado da pesquisa é a faixa etária das empreendedoras: a maioria tem idade entre 40 e 64 anos, tanto no cenário nacional quanto em Mato Grosso do Sul. No país, o número de empreendedoras nas micro e pequenas empresas cresceu 108%.
Renda - De acordo com Karla Bethânia, superintendente de Agronegócios da Sedesc, a rentabilidade dos produtores da agricultura familiar em Campo Grande, especialmente na Organocoop, fica acima da média nacional.
“Antes, apenas 30% conseguiam renda acima de um salário mínimo por mês. E, mesmo considerando que se trata de uma produção sazonal, a partir do momento que aderiram ao programa de orgânicos, 70% deles passaram a ter renda acima dos R$ 800”, explica Karla, citando dados de uma pesquisa realizada em 2012.
Hoje, de acordo com a superintendente, a renda mensal dos associados da Organocoop fica entre R$ 1,2 e R$ 5 mil, considerando apenas o faturamento da feira de orgânicos (às quartas-feiras na Praça do Rádio e aos sábados no estacionamento da Prefeitura).
“Em comparação com a agricultura familiar nacional, estamos muito bem, porque, em nível nacional, a maioria dos produtores ainda depende dos programas de transferência de renda do governo, como o Bolsa Família”, afirma Karla.
E os produtores de Campo Grande estão conseguindo renda melhor também com relação aos demais municípios de Mato Grosso do Sul. A informação é do gerente regional do Sebrae, Marcus Rodrigo de Faria, que explica: “O modelo adotado, com atendimento e orientação técnica, e também a organização dos próprios produtores, tem favorecido o crescimento. E, sem dúvida, nos empreendimentos rurais em que a mulher assume a organização, os resultados são sempre melhores”.