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Comportamento

Jovens acham que aqui é Japão e arriscam vida com arigatô no trânsito

Saudação "japonesa" na faixa de pedestre pode até funcionar, mas por aqui está longe de ser realidade

Por Natália Olliver | 07/11/2025 07:07

De repente, jovens acham que estão no Japão e arriscam a vida confiando na educação de motoristas no trânsito da Capital. Eles param na faixa de pedestres e agradecem aos condutores com uma saudação. O gesto é uma forma de valorizar o ato de eles terem parado. O hábito é corriqueiro no país asiático, mas, por aqui, é só perigo mesmo. A cena é uma nova 'trend' (tendência) que surgiu nos últimos dias no TikTok.

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Jovens em Campo Grande têm reproduzido uma tendência do TikTok que imita o costume japonês de agradecer motoristas com uma saudação ao atravessar a faixa de pedestres. A prática, comum no Japão, reflete valores culturais de respeito mútuo e harmonia social, conhecidos como "kansha". Especialistas e moradores locais alertam para os riscos da brincadeira, já que a realidade do trânsito brasileiro é diferente da japonesa. Segundo o Detran-MS, ainda predomina a cultura de que veículos têm preferência sobre pedestres, embora a lei determine o contrário. A tendência divide opiniões entre os jovens, que a consideram divertida, mas possivelmente passageira.

Apesar do momento parecer engraçado para eles, a brincadeira pode terminar em susto e quase atropelamentos. Isso porque, em Campo Grande, a educação no trânsito está bem longe da asiática. Se você caiu de paraquedas no vídeo e não sabe o que significa a saudação, nós te explicamos.

Jovens acham que aqui é Japão e arriscam vida com arigatô no trânsito
Jovens acham que aqui é Japão e arriscam vida com arigatô no trânsito
Estudantes viram vídeo mas acreditam que realidade aqui está muito distânte para dar certo (Foto: Natália Olliver)

No Japão, os pedestres costumam agradecer aos motoristas que param, mesmo quando isso significa apenas cumprir a regra. A prática reflete valores culturais profundos, como respeito mútuo, harmonia social e reconhecimento do coletivo, resumidos no famoso conceito de “kansha”, que é a gratidão presente nas pequenas ações do dia a dia.

É comum, por exemplo, que os motoristas japoneses parem espontaneamente nas faixas e que os pedestres aguardem pacientemente o sinal abrir, mesmo que a rua esteja vazia. Atravessar no vermelho é visto como falta de respeito. No Brasil, o costume ganhou outro tom.

O Lado B foi até a Escola Joaquim Murtinho para saber o que os jovens acham da tendência e se isso pode pegar por aqui. A resposta foi esperançosa, mas realista.

“Já vi esse vídeo e achei que era uma brincadeira. Mandaram-me como meme e ri bastante”, contou Leonardo Sorbi, de 15 anos. “Não sei se é uma tentativa de trazer a cultura japonesa para cá, mas seria bom. Há muita gente interessada nessa cultura no país”, completa.

Para Ruby Pereira, de 14 anos, o gesto é puro charme: “É uma gracinha. Eu super faria. Acho engraçado. Quando algo está na moda, quero fazer também.”

Já João Lucas (17) e Kauãn (18) acham a moda curiosa, mas com prazo de validade: “Agradecer é legal se o carro realmente parar, mas, no meio da rua, é zoeira. Duas semanas e isso acaba. Se for faixa sem sinal, aí sim vale, mas os carros já parariam. É mais para chamar a atenção.”

Mas por trás disso há uma discussão séria. Segundo o gestor em Educação para o Trânsito do Detran-MS (Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul), Ivar Custódio, o gesto escancara uma diferença brutal na cultura no trânsito.

Segundo ele, o Brasil é um país com muita regionalidade e há estados e cidades onde o pedestre é mais respeitado, o que não é o caso de Campo Grande.

“Ainda predomina a ideia de que o carro tem preferência, e isso não é verdade. Nós temos trabalhado há 10 anos com isso e melhorou, mas é cultural aqui que o veículo tem preferência. Isso não é verdade. Se você é um cidadão habilitado, tem a obrigação de entender que os veículos maiores são responsáveis pela segurança dos menores. No caso, o veículo menor é o pedestre. Infelizmente, não vemos isso na maioria das vezes. Vemos veículos não fazendo isso.”

Ele pontua que os pedestres têm consciência de que estão no topo da hierarquia do trânsito, mas não são respeitados. “Os motoristas não dão preferência. Isso no Japão acontece naturalmente, mas aqui não chegamos no ideal, que é o respeito ao pedestre. Quem sabe um dia conseguimos publicar esses vídeos onde o pedestre vai fazer a saudação e dá certo. Precisa de muito trabalho para termos respeito ao próximo.”

Quem sabe muito bem como as coisas funcionam no Japão é Thiago Aparecido dos Santos Higa, de 33 anos. Ele passou anos nas cidades de Echizen, Fukui, e Kuwana. Para ele, o choque cultural nesse sentido foi enorme.

“As crianças são independentes, elas vão para escola sozinhas e voltam sozinhas, então elas usam o ato de levantar a mão quando estão pedindo passagem na rua e também o ato de se curvar para agradecer. Isso não só no trânsito, mas também durante o seu dia a dia".

Thiago conta que um dos momentos em que mais sentiu a diferença foi no trabalho. “Você vai ver alguém te pedir licença, não só falando, mas a pessoa vai se curvar para você; se ela fizer algo errado, vai pedir desculpa e vai se curvar. Também é um ato de agradecimento geral.”

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