Tabeliã denunciou desembargadores ao CNJ por suposto favorecimento à advogada
Advogada que teria sido beneficiada é Iolanda Michelsen Pereira, investigada por advocacia predatória
Tabeliã de Iguatemi, a 412 Km de Campo Grande, denunciou os desembargadores Alexandre Bastos, Sideni Soncini Pimentel e Vladimir Abreu ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça) por suposto favorecimento à advogada Iolanda Michelsen Pereira, investigada por envolvimento em advocacia predatória, conforme a Operação Arnaque, do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), em julho de 2023.
RESUMO
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A tabeliã de Iguatemi, Perla Lilian Delgado, denunciou ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) os desembargadores Alexandre Bastos, Sideni Soncini Pimentel e Vladimir Abreu, além do juiz Antônio Adonis Mourão Júnior, por suposto favorecimento à advogada Iolanda Michelsen Pereira em um caso de registro de imóvel. A denúncia, que se baseia em um caso de 2021, alega que os magistrados teriam favorecido Iolanda em decisões judiciais, contrariando a legislação e a jurisprudência, em benefício da advogada que, na época, buscava registrar um imóvel adquirido por um valor abaixo do preço de mercado. O pedido de liminar para impedir o registro do imóvel sem o pagamento do imposto sobre a edificação foi negado pelo CNJ, que entendeu que não há elementos para sustentar a acusação de favorecimento.
Os três foram alvo na semana passada da Operação Ultima Ratio da Polícia Federal, por supostos crimes de corrupção em vendas de decisões judiciais, lavagem de dinheiro, organização criminosa, extorsão e falsificação de escrituras públicas. Além dos três, o juiz substituto da Vara Única de Iguatemi, Antônio Adonis Mourão Júnior também foi denunciado na mesma reclamação disciplinar. Ele, entretanto, não faz parte dos investigados pela operação da PF.
A denúncia ao CNJ é deste ano, mas o fato que a motivou é de 2021, quando a advogada acionou a Justiça contra a tabeliã por possível ato ilegal e abusivo. Consta que, em novembro daquele ano, Iolanda foi até o Serviço Registral de Imóveis de Iguatemi para registrar uma casa que havia comprado. Entretanto, a cartorária rejeitou a averbação por entender haver irregularidade.
O imóvel comprado pela advogada tinha, na época, valor comercial de R$ 830 mil, mas o adquiriu pela metade do preço, R$ 440 mil, em negociação com o proprietário. Foram R$ 90 mil de entrada e R$ 350 mil financiados. Conforme a alegação da advogada, a oficial do tabelionato não aceitou o fato de que o imposto foi cobrado conforme o valor do contrato de financiamento e não sobre o valor de venda avaliado e sobre a edificação.
Assim, solicitou declarações por parte da assessoria jurídica da Prefeitura de Iguatemi, bem como pelo responsável pela emissão da cobrança do ITBI, que informassem a razão da cobrança a menor. Iolanda apresentou todos os documentos, ainda assim, eles foram rejeitados pela responsável pelo cartório de imóveis.
Com essa demora, a advogada não conseguiu registrar seu imóvel, sendo que em primeiro grau, houve sentença favorável a ela pela juíza Mayara Luiza Schaefer Lermen para que em 72 horas, a tabeliã, através de liminar, fizesse o registro. O entendimento levou em conta decisão modelo do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que definiu que cabe ao município e não aos notários “aferir, em cada caso, se o valor real da operação, ou seja, aquele indicado no contrato, coincide, ou não, com o valor de mercado (venal) do imóvel negociado”.
Perla, através de sua advogada, Margarete Moreira Delgado, entrou com embargos, este, decidido por Adonis Mourão, que o rejeitou e manteve a decisão anterior "permanecendo incólume os termos da sentença".
De lá para cá, todas as decisões foram favoráveis à advogada Iolanda, inclusive em segundo grau. Atualmente, o caso está nas mãos do então vice-presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, Dorival Renato Pavan, que após a Operação Ultima Ratio, na semana passada, assumiu a presidência da Corte.
Outro lado - A tabeliã Perla Lilian Delgado se defende afirmando que “inexiste ato de ilegalidade ou abuso de poder”, porque é seu “dever fiscalizar de modo objetivo a documentação para ingresso de registro no sistema fólio, com base no disposto no art. 198 da Lei de Registros Públicos" e afirma que emitiu nota de exigência para complementar o recolhimento do imposto que apresentava "manifesta discrepância do recolhido com o devido na proporção de aproximadamente 50% a menor”.
Ressalta que era necessário haver certeza do valor recolhido na transação para que futuramente ela não fosse responsabilizada por algum erro, já que “a Guia de ITBI deixava claro o não recolhimento da edificação, e o contrato deixava claro que o valor da avaliação do imóvel era de R$ 830.000,00, faltando recolher sobre R$ 390.000,00”, e assim, emitiu as notas de exigência indicando a necessidade de recolhimento da diferença do imposto.
Em manifestações anteriores, tanto o MP quanto a PGE (Procuradoria-Geral de Mato Grosso do Sul) entenderam que a alíquota havia sido cobrada a menor.
CNJ - Ao CNJ, Delgado fez uma reclamação disciplinar alegando que tanto os desembargadores já citados quanto o juiz substituto de primeiro grau, Adonis Mourão "por prática de atos ilegais ou abusivos praticados pelos requeridos nos autos" e que houve "inexatidão da base de cálculo perpetrado pelo citado juiz de direito, nos autos do mandado de segurança, cujo objeto perquiria o exame da exatidão do recolhimento do ITBI".
Segundo ela, “tanto o Juiz Corregedor da Serventia Extrajudicial, quanto os Desembargadores atuaram em desconformidade com o código tributário do município, bem como de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar a composição da base de cálculo do ITBI de imóvel lavrado na referida serventia”.
Afirma que houve inexatidão da base de cálculo pelo juiz de primeira instância, que “possui direito de ter o seu processo julgado por magistrado imparcial e que [os reclamados] agiram com fim de beneficiar a advogada impetrante Iolanda Michelsen Pereira, quando do trâmite se observa que ocorreu segundo os interesses da impetrante, ora (sic) acelerado”.
Por fim, pede ao CNJ medida liminar que não a obrigue a fazer o registro do contrato sem o devido recolhimento do imposto sobre a edificação e que o conselho “apure os fatos acima narrados, diante das supostas decisões teratológicas, instaurando-se o competente processo legal administrativo para aplicação da sanção disciplinar cabível e prevista em lei para a espécie”.
O pedido foi negado pelo ministro Mauro Campbell Marques, corregedor nacional de Justiça. Para ele, "mesmo invocações de erro de julgamento ou erro de procedimento não se prestam a desencadear a atividade correcional, salvo exceções pontualíssimas das quais se verifique de imediato, infringência aos deveres funcionais pela própria teratologia da decisão judicial ou pelo contexto em que proferida esta, o que também não se verifica na espécie".
A reportagem entrou em contato com Perla através de sua advogada e no Cartório de Imóveis de Iguatemi, mas ela não foi encontrada.
Matéria alterada às 14h54 para acréscimo e correção de informações.
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