De office boy a guardião da memória, Sebastião vive há 47 anos na Santa Casa
Trajetória do funcionário está vinculada à história do hospital hoje contada em "museu"
Aos 67 anos, Sebastião Parente Teles não guarda apenas as chaves do Centro Histórico e Cultural da Santa Casa de Campo Grande; ele é a própria memória viva do maior hospital de Mato Grosso do Sul. Sua jornada, iniciada como office boy em 1978, aos 20 anos, entrelaça-se de tal forma com a instituição que foi ali que encontrou sua esposa e viu nascerem seus três filhos.
A jovem era a chefe do Arquivo do hospital e de uma amizade surgiu o amor. Logo, em 1989, decidiram se casar. Atualmente, ambos estão aposentados, mas Sebastião - que diz não conseguir ficar parado - permanece em atividade.

Conhecedor das memórias e de cada detalhe dos bastidores da terceira maior Santa Casa do Brasil, hoje ele é o curador do Centro Histórico e Cultural do hospital. Inaugurado em 2019, o espaço não é só um arquivo de fotos e objetos antigos, é um baú de lembranças onde a escrivaninha dos primeiros presidentes e tantos outros itens, como a ata de criação do hospital, contam pedaços da própria vida de Sebastião, ou de histórias que ele ouviu e guardou com carinho ao longo dos anos.
“É um prazer fazer parte dessa história. Eu venho trabalhar todo dia como se fosse o meu primeiro dia. Eu amo contar a história e defender a Santa Casa. A gente só ama o que a gente conhece de verdade, por isso eu convido as pessoas a virem conhecer o Centro Histórico, a conhecerem a Santa Casa. Tenho certeza que vocês vão se encantar com este lugar”, confessa emocionado, Sebastião.
Ao longo de sua jornada, ele passou por várias funções, de office boy a faturamento, compras e internação. Mas foi no Pronto Socorro, como Gerente de Apoio Administrativo, que ele sentiu que realmente encontrou seu propósito.
Por cerca de 30 anos, ele esteve ali, numa época em que não existia regulação de leitos ou o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência). Eram os próprios funcionários que faziam a triagem e classificavam a urgência de cada vida que chegava.
“Eu já até dirigi ambulância. Para mim, nunca foi um trabalho difícil. Eu gosto de atender as pessoas, ajudar as famílias. Depois que o paciente entrava, eu fazia questão de ir ver como ele estava. E muitos me recebiam felizes e diziam: ‘Chegou meu anjo da guarda’”, recorda Sebastião, com um brilho nos olhos.
Hoje, ele cuida de um acervo que conta não só os passos da instituição até aqui - com documentos, fotos e ferramentas administrativas - mas também fala da evolução da medicina, com antigos equipamentos de uso hospitalar. No local, Sebastião mostra aparelhos curiosos como o de drenagem torácica, que é guardado em uma caixa de madeira. Ele explica que os fios e tubos metálicos, com a aparência rústica, eram utilizados para drenar o pulmão de pacientes.
Em uma mala menor, está o aparelho eletrocardiográfico, que era utilizado para verificar a atividade elétrica do coração do paciente e apontar a saúde do órgão. O resultado, obtido em forma de gráfico com as ondas do eletrocardiograma, era impresso em um papel especial. Além desses objetos, a lupa cirúrgica e seus parafusos grandes também chamam a atenção por ser bem maior e mais pesada que as utilizadas atualmente.
108 anos de história - Antes de se tornar o maior hospital de Mato Grosso do Sul, a Santa Casa de Campo Grande começou a ser sonhada em 1917, a partir de uma lista de doações apelidadas de “esmolas”, organizadas por moradores que sentiam falta de um hospital na cidade ainda pequena, com cerca de 8 mil habitantes.
Sem nenhuma instituição de saúde à época, a então comunidade da freguesia de Santo Antônio de Campo Grande viu lideranças como Eduardo Santos Pereira e Bernardo Franco Baís mobilizarem doações que variavam de 5 mil a 500 mil réis. O esforço coletivo resultou em 27 contos e 80 mil réis arrecadados por 178 pessoas.
A sociedade beneficente que deu origem à Santa Casa foi formalizada em 1919, e a sede do hospital, com 40 leitos, começou a ser construída em um terreno comprado por Baís por 10 contos de réis, em uma área de 60 mil m² na avenida Mato Grosso, visão de futuro para uma região afastada do centro na época.

O atendimento foi pensado desde o início para acolher tanto quem podia pagar quanto os chamados "indigentes", os doentes pobres e desamparados. Um dos símbolos desse espírito solidário foi o carroceiro José Mustafá, o Zé Bonito, que transportou gratuitamente todos os materiais de construção do hospital com sua carroça, ficando eternizado no nome do auditório da instituição.
Com 108 anos de história desde a ideia e 97 de portas abertas, a Santa Casa é hoje a terceira maior do Brasil, atendendo pelo SUS, convênios e de forma particular.
Serviço: Os interessados em conhecer o Centro Histórico e Cultural da Santa Casa podem agendar a visita pelo telefone 3322-4576. O local está aberto de segunda a sexta-feira, das 8h às 12h e das 13h às 18h.

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