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Economia

Varejo e serviços vão continuar com fatia mínima dos incentivos fiscais até 2028

Setor representa 65% do PIB estadual, sustenta a arrecadação, mas é beneficiado com apenas 2,7% das renúncias

Por Viviane Monteiro, de Brasília | 04/11/2025 15:38
Varejo e serviços vão continuar com fatia mínima dos incentivos fiscais até 2028
Imagem aérea do movimento na principal rua do Centro de Campo Grande, a 14 de Julho (Foto: Arquivo)

As pequenas e médias empresas dos setores de varejo e serviços de Mato Grosso do Sul, embora respondam por grande parte da arrecadação estadual, continuam praticamente fora do alcance dos incentivos fiscais e os valores devem continuar bem reduzidos até 2028..

RESUMO

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A Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas de Mato Grosso do Sul (FCDL-MS) critica a distribuição desigual dos incentivos fiscais no estado. Segundo a entidade, o varejo e serviços, responsáveis por 65% do PIB estadual e 62% do emprego formal, receberão menos de R$ 1 bilhão dos R$ 37,9 bilhões previstos em renúncias fiscais para 2026-2028. O agronegócio e a indústria de transformação concentram 83,13% dos benefícios fiscais, beneficiando principalmente grandes empresas exportadoras. A presidente da FCDL-MS, Inês Santiago, defende maior equidade na distribuição dos incentivos, destacando que o varejo é fundamental para a economia local e absorve grande parte da mão de obra informal.

A avaliação é da presidente da FCDL-MS (Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas), Inês Santiago, que critica a baixa participação do segmento na política de renúncia fiscal do Estado. Ela defende equidade e justiça tributária no uso dos recursos provenientes do pagamento de tributos.

Segundo ela, o varejo e os serviços devem receber menos de R$ 1 bilhão em incentivos dentro dos R$ 37,9 bilhões de renúncia fiscal previstos para o triênio 2026-2028, montante que beneficiará majoritariamente a indústria de transformação e o agronegócio, conforme a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) já aprovada pela Assembleia Legislativa. A LDO estima renúncia de ICMS de R$ 11,9 bilhões em 2026 (alta de 42% em relação a 2025), R$ 12,6 bilhões em 2027 e R$ 13,4 bilhões em 2028.

Para Inês, o setor de varejo e serviços sustenta a economia local, emprega a maioria da população ativa e é responsável pela maior parte da arrecadação de tributos do Estado. Ela não estimou a participação exata desse segmento na carga tributária estadual, mas informou que, com base no Portal Impostômetro da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), a arrecadação de Mato Grosso do Sul somou brutos R$ 35 bilhões de janeiro a 3 de novembro deste ano, o equivalente a 0,99% do total nacional.

“Enquanto o agronegócio e a indústria recebem quase todos os incentivos fiscais, o setor de varejo e serviços, que mais emprega, absorve mão de obra informal e responde por 65% do PIB e 87% dos CNPJs de Mato Grosso do Sul — continua sobrecarregado de impostos, sustentando a economia local sem receber apoio proporcional”, afirmou Inês, que também é advogada.

Com base em estudo da FGV-Ibre sobre a política fiscal de Mato Grosso do Sul, que foi encaminhado ao Campo Grande News, a dirigente da FCDL-MS destaca que o agronegócio e a indústria de transformação concentram juntos 83,13% dos incentivos fiscais previstos para 2026 — valores concentrados em pouquíssimas empresas, segundo ela. Os dados têm como base a LDO do próximo ano.

No caso da indústria de transformação, a participação mais que dobra de 26,54% em 2025 para 57,3% em 2026. Já o setor de agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura deve recuar de 29,53% para 26%, ainda assim mantendo uma fatia considerada elevada diante da baixa contribuição do setor para o emprego e o PIB estadual.

O segmento de comércio e reparação de veículos automotores e motocicletas deve ampliar sua participação de 12,75% para 14,61%. Apesar do leve aumento, Inês ressalta que essa fatia corresponde a apenas um dos ramos do varejo, o chamado “varejo ampliado”, e ainda é distribuída entre milhares de empresas.

“O estudo mostra a concentração dos incentivos em apenas dois setores, em detrimento do mais amplo e maior gerador de emprego e renda, que é o varejo”, afirmou Inês, que é também advogada.

O chamado “varejo restrito”, que inclui comércio de alimentos e vestuário, não vem sendo contemplado pela política de incentivos fiscais estaduais, segundo ela.

Varejo e serviços vão continuar com fatia mínima dos incentivos fiscais até 2028

Diante desse cenário, Inês critica o que considera uma distorção na concessão dos benefícios. “Não somos contrários ao apoio ao agronegócio ou à indústria, mas defendemos equilíbrio e justiça tributária no uso dos recursos provenientes dos tributos”, disse.

A presidente também chama atenção para a ausência de incentivos às pequenas empresas agrícolas, como pequenos frigoríficos e a agricultura familiar, responsáveis por abastecer a mesa dos sul-mato-grossenses.

O economista Giosvaldo Teixeira Jr., assistente no levantamento da FGV/Ibre, concorda que, de forma geral, o setor de serviços é menos beneficiado na concessão de incentivos fiscais por diversos motivos. “Um deles é ser um segmento que já possui demanda natural e menor barreira de entrada. Alguns estados beneficiam mais o varejo, mas, nesses casos, os incentivos costumam estar ligados à cesta básica”, explicou.

Ele ressalvou, porém, não dispor de mapeamento específico para as empresas de varejo e serviços do Estado. “Em geral, serviços pagam ISS e, em casos específicos, ICMS. Já o varejo paga predominantemente ICMS, mas depende do enquadramento da empresa”, completou.

Beneficiárias da renúncia fiscal

Levantamento da FGV-Ibre obtido pela reportagem mostra que 1.535 empresas são beneficiadas em Mato Grosso do Sul pela política de renúncia fiscal. Entre elas estão gigantes com foco no mercado exportador, como Eldorado Brasil Celulose, Suzano e grandes frigoríficos — JBS, Marfrig Global Foods, Aurora Alimentos e BRF S.A., esta última recentemente incorporada pela Marfrig, formando a MBRF.

Os dados, referentes a 2024, foram obtidos no Portal da Transparência do governo estadual. A Constituição Federal e a Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011) determinam a obrigatoriedade da publicidade das renúncias fiscais, já que esses benefícios implicam redução da arrecadação tributária para programas sociais.

Emprego, informalidade e mortalidade das empresas

A presidente da FCDL-MS ressalta o peso do setor de varejo e serviços na economia e no mercado de trabalho. A população economicamente ativa (PEA) do Estado é de 1,434 milhão de pessoas, das quais 421 mil possuem carteira assinada no varejo, representando 62% do emprego formal. Somados os 724 mil trabalhadores informais, o setor de comércio e serviços emprega 1,145 milhão de pessoas — a maior parte da força de trabalho sul-mato-grossense.

“Quando uma pequena empresa formal fecha, o empreendedor e seus funcionários saem da formalidade, mas continuam trabalhando na informalidade. O varejo é o verdadeiro colchão social da economia local”, afirmou Inês.

A sobrevivência das pequenas empresas de varejo e serviços representa um desafio no Estado. Dados da Junta Comercial do Estado de Mato Grosso do Sul (JUCEMS), atualizados em 3 de novembro, mostram que foram extintas neste ano 239.378 empresas, a maioria de empresários individuais. O comércio é o setor mais impactado, com 119.934 encerramentos, 38,7% do total. Nesse grupo, destacam-se o comércio varejista de artigos do vestuário e acessórios (34.702 empresas), o comércio de bebidas (18.532) e lanchonetes, casas de chá e similares (16.366).

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Força econômica

Mesmo assim, segundo Inês, o setor responde por 72% do PIB nacional e 65% do PIB de Mato Grosso do Sul. Em Campo Grande, o varejo é responsável por 81% da riqueza produzida. Atualmente, 87,3% dos CNPJs do Estado (342,4 mil registros) pertencem ao comércio e aos serviços; a indústria responde por 12% e o agronegócio, por apenas 0,57%.

Para a dirigente, a riqueza do agronegócio não permanece nos municípios produtores, já que grande parte da receita vem da exportação. “Os insumos são comprados no exterior e a produção não gera desenvolvimento local”, criticou.

Além disso, Inês atribui a alta do preço da carne no Estado ao foco exportador da indústria de proteína animal. “Mesmo com um dos maiores rebanhos do país, o acesso à carne é limitado porque a produção é voltada à exportação. Isso é uma irresponsabilidade. Garantir segurança alimentar é dever do Estado”, afirmou.

Embora as empresas exportadoras que recebem incentivos fiscais para aumentar a competitividade no exterior tragam divisas ao país e contribuam para a balança comercial, seus efeitos sobre a economia local são limitados.

A dirigente da FCDL-MS cobrou transparência nas contrapartidas oferecidas pelos grandes grupos beneficiados, lembrando que os incentivos fiscais representam cerca de 50% da receita estadual, segundo dados da FGV-Ibre. Outra parte considerável do orçamento é destinada ao pagamento da folha do funcionalismo. “O que sobra para investir em infraestrutura, saúde e educação é muito pouco”, pontuou.

Estudo da FGV propõe teto

Na última sexta-feira, a FGV-Ibre divulgou um estudo, em parceria com a organização MaisProgresso.org, recomendando a criação de um teto e de prazo de vigência para os benefícios fiscais — tanto nos Portais da Transparência quanto nas estimativas apresentadas nas Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDOs). Os pesquisadores defendem regras mais claras, avaliação de resultados e a criação de um órgão gestor para acompanhar as renúncias.

O estudo também propõe diretrizes de médio prazo que orientem a concessão de benefícios, integrando as políticas de gasto tributário ao planejamento econômico e fiscal. A ideia é garantir aderência às prioridades definidas por uma estratégia formal de desenvolvimento estadual.

Os pesquisadores sugerem ainda que as análises econômico-financeiras considerem variáveis como geração de emprego, nível de produção, preços, produtividade e cadeia de fornecedores beneficiados, de forma a permitir um monitoramento mais efetivo e transparente das políticas de incentivo.