De co-piloto esportivo a ambientalista, Nelson mudou de vida pelo Pantanal
Advogado apaixonado pelo bioma vendeu bens para criar ONG dedicada à preservação dos rios da planície
Apaixonado pelo Pantanal, o advogado Nelson Araújo Filho transformou o prazer de sobrevoar o bioma em missão para defendê-lo. Vendeu bens, criou o Instituto Agwa e hoje monitora as águas e os campos que considera seu maior amor.
RESUMO
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Nelson Araújo Filho, advogado e ex-co-piloto, transformou sua paixão pelo Pantanal em uma missão ambiental. Após sobrevoar o bioma por anos, ele fundou o Instituto Agwa em 2018 para proteger rios como o Taquari e o Paraguai, ameaçados pelo assoreamento. Vendeu bens pessoais, incluindo seu avião, para financiar documentários e ações de conservação. Hoje, Nelson alerta sobre a relação entre assoreamento e queimadas no Pantanal, destacando que sedimentos acumulados nos rios criam áreas propícias a incêndios. Defensor do turismo sustentável, ele acredita que a integração entre ciência, conservação e economia é essencial para preservar o bioma. Seu trabalho continua focado no monitoramento e na conscientização sobre os desafios ambientais da região.
Tudo começou em 1993, quando comprou um avião. Nos voos, encontrou a sensação que define como “um deleite”. Sobrevoava o Pantanal, contemplava suas belezas e traçava caminhos que, depois, percorria por terra, acompanhado da família.
“Eu tinha uma curiosidade imensa sobre o Pantanal. Hoje é comum fazer trilha, naquela época não. Eu fiquei louco. Aquilo é bonito demais, não tem como explicar”, recorda, emocionado.
Nelson conta que, por anos, viveu entre pousos e decolagens. Tornou-se ouvinte atento dos pilotos mais experientes, com quem voava como co-piloto. Eles comentavam sobre as mudanças na paisagem, como áreas antes verdes que começavam a secar, e rios que se estreitavam.
A criação da ONG
Em uma dessas expedições, Nelson conheceu o Rio Taquari, na região norte de Mato Grosso do Sul, e percebeu a ameaça do assoreamento que sufocava seu leito. Ao ouvir rumores de que produtores cogitavam intervir no curso d’água, mergulhou em pesquisas e decidiu agir.
Em 2018, fundou o Instituto Agwa, com o objetivo inicial de proteger o Taquari. Logo, a iniciativa ampliou o foco para o Rio Paraguai e outras bacias pantaneiras, onde o problema se repetia.
Segundo o ambientalista, a militância teve seu custo. Ele conta que precisou vender bens para investir na produção de mini-documentários. Seu propósito era chamar a atenção do mundo para os desafios que o meio ambiente enfrenta na região.
Em certo momento, se desfez do avião, ferramenta que o havia aproximado do Pantanal, para sustentar o projeto. Hoje continua a voar sobre o bioma, agora com seu drone.
Turismo sustentável
Ao avaliar a própria trajetória, o ambientalista afirma que sua comunicação não alcançou o público que esperava, mas garante que não pensa em desistir. Ele acompanhou de perto os incêndios que devastaram o Pantanal em 2020 e, desde então, concentra esforços na defesa do Rio Paraguai.
Nelson acredita que a proteção do bioma depende da integração entre ciência, conservação e desenvolvimento econômico, especialmente com investimento no turismo sustentável. Para ele, há exemplos bem-sucedidos em outras partes do mundo, como na África, onde a preservação atrai visitantes e gera renda para as comunidades locais.
Assoreamento e queimadas
Hoje, o ambientalista se divide entre Campo Grande e uma propriedade às margens do Rio Paraguai, no Pantanal do Paraguai-Mirim. O local escolhido é uma cordilheira, ou seja, um ponto estratégico que resiste às cheias e favorece a observação para entender os ciclos da água. Ali funciona também como segunda sede do Instituto Agwa.
Após 30 anos de estudos, avaliando mapas e monitorando o comportamento das águas, Nelson defende a tese de que o assoreamento dos rios Paraguai, Cuiabá e São Lourenço está no centro das grandes queimadas que têm devastado o Pantanal desde 2020.
Segundo ele, a areia acumulada nas calhas impede o fluxo normal da água, formando campos alagados que, ao secarem, deixam material orgânico que serve de combustível para o fogo.
O ambientalista afirma monitorar, com regularidade, os dados do LASA/UFRJ (Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro) e concluiu que os 4 milhões de hectares queimados em anos anteriores no Pantanal correspondem a áreas assoreadas, onde sedimentos se acumulam e aumentam o risco de incêndios durante as secas.
“Pantanais de Areia” tornou-se, inclusive, o título do livro de poesias que Nelson lançou em novembro de 2024. A obra retrata histórias, belezas e desafios de uma parte do Pantanal conhecida como “Payaguás dos Xarayés”.