Carregadores de carros elétricos em condomínios: uma nova realidade sem regras
A crescente presença de carros elétricos no Brasil tem trazido novos desafios para os condomínios, especialmente no que se refere à instalação de estações de recarga. Essa nova demanda esbarra em um cenário jurídico nebuloso, onde ainda não há uma legislação específica que regulamente a instalação e o uso de carregadores em edifícios residenciais. O que se observa é uma corrida por adaptações, muitas vezes feitas sem o devido planejamento ou respaldo técnico.
Recentemente, o Corpo de Bombeiros do estado de São Paulo anunciou o lançamento de uma cartilha com orientações e regras para a instalação de carregadores em garagens de condomínios. A medida vem em resposta ao aumento do número de veículos elétricos nas cidades paulistas e à necessidade de se garantir segurança nas instalações. O documento deve abordar desde a infraestrutura elétrica necessária até as normas de prevenção contra incêndios.
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No entanto, essa iniciativa ainda é isolada. Em outras cidades brasileiras, como Campo Grande — onde o crescimento de veículos elétricos também é notável — ainda não há diretrizes locais ou estaduais. A ausência de uma legislação nacional faz com que os condomínios adotem medidas com base na NBR 5410 (norma técnica da ABNT que trata das instalações elétricas de baixa tensão) e em orientações de engenheiros eletricistas ou empresas especializadas. Ainda assim, muitas dessas medidas não passam por um crivo de segurança padronizado ou são ignoradas por administradores e moradores desinformados sobre os riscos envolvidos.
A falta de regulamentação específica gera insegurança jurídica, conflitos entre condôminos e síndicos e, principalmente, riscos à segurança coletiva. Em muitos casos, os moradores simplesmente instalam pontos de recarga de forma improvisada em suas vagas de garagem, conectando os carregadores a tomadas convencionais, sem qualquer avaliação sobre a capacidade da rede elétrica do condomínio. Essa prática pode causar sobrecarga no sistema, curtos-circuitos e até incêndios.
Outro ponto importante é o custo da adaptação. Instalar uma estação de recarga exige não apenas a adequação da parte elétrica, mas também, em muitos casos, a contratação de uma demanda maior de energia junto à concessionária. Isso impacta diretamente na taxa condominial e gera discussões sobre quem deve arcar com esses custos: o morador que tem o carro elétrico ou o condomínio como um todo, em nome da modernização e valorização do empreendimento?
A ausência de regras claras abre espaço para dúvidas comuns: o condomínio pode proibir a instalação de carregadores? É preciso aprovação em assembleia? Há necessidade de projeto técnico? E se a instalação for mal feita e causar danos a outras unidades, quem é o responsável?
Enquanto essas perguntas seguem sem respostas definitivas, o que se recomenda é cautela. Os síndicos devem buscar respaldo técnico antes de autorizar qualquer instalação, exigir projeto assinado por profissional habilitado e aprovar previamente em assembleia as alterações na rede elétrica. Além disso, é recomendável prever no regimento interno ou em um regulamento específico as condições para uso, custeio e manutenção das estações de recarga.
A cartilha que será lançada pelo Corpo de Bombeiros de São Paulo pode servir como modelo para os demais estados, incentivando uma padronização mínima. No entanto, a necessidade de uma legislação federal sobre o tema é urgente. Assim como ocorreu com os bicicletários, antenas de telecomunicação e outras inovações que chegaram primeiro à realidade condominial antes de serem reguladas, os carregadores de carros elétricos exigem atenção do poder público.
Até lá, a responsabilidade recai sobre os gestores condominiais, que devem estar atentos às boas práticas e buscar sempre o equilíbrio entre inovação, segurança e a convivência harmoniosa entre os moradores.
(*) Alex Garcez, advogado especialista em condomínio
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