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Campo Grande cada vez maior: área urbana tem salvo-conduto para crescer 83%

Apesar de novos loteamentos, o atual perímetro urbano já é suficiente para milhões de moradores

Por Aline dos Santos | 26/08/2025 07:05
Campo Grande cada vez maior: área urbana tem salvo-conduto para crescer 83%
Campo Grande cada vez maior: área urbana tem salvo-conduto para crescer 83%
Na saída para Três Lagoas, projeto de loteamento quer "esticar" a cidade. (Foto: Henrique Kawaminami)

Com 954.537 habitantes, mas localizada numa área urbana capaz de abrigar sete milhões de pessoas, Campo Grande faz jus ao nome e já assegurou no último plano diretor a possibilidade de crescer o perímetro urbano em 83%. No mapa, a ZEU (Zona de Expansão Urbana) é uma mancha no entorno do território reconhecido hoje como cidade.

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Campo Grande, capital de Mato Grosso do Sul, pode expandir sua área urbana em 83%, conforme previsto no Plano Diretor de 2018. A Zona de Expansão Urbana (ZEU) foi criada para receber novos loteamentos, mas especialistas alertam que a decisão foi influenciada por pressões políticas e do setor imobiliário. A expansão exige contrapartidas, como infraestrutura e serviços, mas há preocupações sobre a falta de planejamento adequado. Enquanto isso, moradores de áreas periféricas, como o Jardim Colúmbia, enfrentam problemas como falta de asfalto e saneamento básico, agravando a qualidade de vida.

“A gente tem um plano diretor que prevê área de expansão que corresponde a 83% da área urbana de Campo Grande, sem nenhuma necessidade”, afirma o doutor em Arquitetura e Urbanismo pela USP (Universidade de São Paulo) e professor na UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Julio Botega.

Campo Grande cada vez maior: área urbana tem salvo-conduto para crescer 83%
Julio Botega é doutor em urbanismo e professor da UFMS. (Foto: Henrique Kawaminami)

O pesquisador destaca que nem sempre a análise técnica se sobrepõe ao político. “Essa expansão veio muito pela pressão política, que é uma pressão também das grandes incorporadoras e construtoras. Exatamente para que possam continuar construindo de forma indiscriminada. Avançando sobre regiões que não teriam essa necessidade”, diz o professor.

De acordo com ele, que acompanhou os debates sobre o plano diretor em 2018, essa zona foi originalmente pensada para receber serviços que a administração não queria mais dentro da cidade, mas acabou sendo permitido o loteamento.

Campo Grande cada vez maior: área urbana tem salvo-conduto para crescer 83%
A Zona de Expansão Urbana é a macha amarela no entorno do perímetro da cidade. (Foto: Reprodução)

A Lei Complementar 341 foi publicada em 28 de dezembro de 2018. A legislação instituiu o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental de Campo Grande.

O interessado em efetuar parcelamento na Zona de Expansão Urbana deverá formalizar o pedido ao Poder Executivo que, após a realização de todos os procedimentos legais necessários à aprovação do empreendimento no órgão municipal competente, encaminhará projeto de lei ao Poder Legislativo para a aprovação do novo perímetro urbano, nos termos da legislação federal.

“O parcelamento do solo na Zona de Expansão Urbana só será permitido mediante contrapartida a ser prestada pelo beneficiário e mediante a aplicação da Outorga Onerosa de Alteração do Uso do Solo [OOAUS]”.

Para aprovação de parcelamento na ZEU, devem ser observadas diretrizes como: demarcação do novo perímetro urbano; definição das áreas que serão utilizadas para infraestrutura, sistema viário, equipamentos e instalações públicas, urbanas e sociais; compatibilização do sistema viário com a malha existente; e garantir a justa distribuição dos ônus e benefícios decorrentes do processo de urbanização do território de expansão urbana e a recuperação, para a coletividade, da valorização imobiliária.

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Mapa mostra localização de projeto de loteamento na saída para Três Lagoas.

Novo condomínio na saída para Três Lagoas – Localizado perto do Jardim Noroeste, ao lado do condomínio fechado Shalom, área que atualmente faz parte da ZEU está em debate para ser incorporada ao perímetro urbano. O projeto urbanístico é composto de 592 moradias.

“É importante salientar que com a implementação da Outorga Onerosa de Alteração do Uso do Solo - de uso rural para uso urbano - a área acrescida ao perímetro urbano constituirá em um novo bairro projetado que se fixará sobre ela, conforme estabelecido em lei específica”, informa o projeto.

Conforme o EIV (Estudo de Impacto de Vizinhança), a viabilidade de alteração de uso do solo rural para urbano depende da expansão do abastecimento de água, tratamento de esgoto, implantação de sistema de drenagem e ampliação do sistema de transporte público para atender os trabalhadores.

Campo Grande cada vez maior: área urbana tem salvo-conduto para crescer 83%
Saída para Três Lagoas, região de Campo Grande em expansão. (Foto: Henrique Kawaminami)

“Através da alteração do uso do solo rural para urbano de parcelamento modalidade loteamento, é previsto que na primeira fase de implantação do empreendimento sejam criados 663 lotes vendáveis (592 residenciais  mais 71 comerciais/serviço)”.

A vida entre a cidade e o campo - Da Rua Mapuera, no Jardim Colúmbia, em Campo Grande, se avista os campos da Fazenda Botas. Entre a rua e a zona rural, fica a BR-163, por onde correm as carretas que escoam a produção de grãos.

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No Jardim Colúmbia, a cidada termina em fazenda, às margens da BR-163. (Foto: Henrique Kawaminami)

Ademir Barbosa, 67 anos, conta que veio da fazenda para ser o primeiro morador do Jardim Colúmbia. “Cheguei aqui em 1982. Não tinha ninguém. Tinha que pegar o ônibus no Nova Lima”, rememora.

Nesses 43 anos, ele viu a chegada de serviços, como coleta de lixo, transporte coletivo e rede de água. Mas, em quatro décadas, nada de saneamento ou asfalto. “Nem carro passava mais aqui na rua. Agora que jogaram essas pedrinhas. Mas parece que a rede de esgoto vai sair”, diz o morador.

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Ademir olha para fazenda, onde morava antes de vir para o Colúmbia. (Foto: Henrique Kawaminami)

Roseli Barbosa da Conceição, 42 anos, destaca que a região é tranquila. Mas o fato de ser fim da área urbana assusta os motoristas de aplicativos e restringe algumas comodidades. “Aqui falta mercado, farmácia, pizzaria. O ônibus também é muito enrolado”.

A distância dos demais bairros também faz surgir brincadeiras, como a de que mora em Cuiabá, a capital do Mato Grosso que fica 700 km de Campo Grande. Para Roseli, a falta do asfalto é o principal problema. Com rinite e bronquite, a moradora trava uma batalha diária contra o pó, potencializado pela ventania típica de agosto, para deixar a casa limpa.

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Para Roseli, a falta do asfalto é o principal problema no Jardim Colúmbia. (Foto: Henrique Kawaminami)

“Queremos asfalto, mas não temos mais esperanças. É muito pó e passo 24 horas limpando. Eu vivo em função da casa”, diz Roseli. Ela conta que o marido tem oficina especializada em pintura de veículos. “Os clientes vêm. Por mais que seja o final do mundo”.

Roseli torce para que a rua seja prolongada, levando não mais ao mato, mas, por exemplo, ao Jardim Colúmbia 2. “Se asfaltasse o bairro, já vinha mais alguma coisa. Se saísse um bairro para cima, aqui virava acesso”.

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Trecho da BR-163 em Campo Grande, na saída para Cuiabá. (Foto: Henrique Kawaminami)

A reportagem solicitou informações à Prefeitura de Campo Grande sobre o total de pedidos de construção na ZEU e contrapartidas, mas nao recebeu resposta até a públicação da matéria.

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